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segunda-feira, 11 de junho de 2018

BRACHETTO


 
 
Um leitor de B&B escreveu o seguinte comentário na matéria "Gattinara Nervi"

1.   Sobre denominações não usuais, o que me diz da Brachetto, Bacco? Comprei recentemente uma garrafa pela curiosidade e sem nunca ter ouvido falar. Depois, percebi que a graduação alcóolica era bem fora dos padrões para um tinto (5,5%) e que a uva pode dar origem a vinhos tranquilos ou espumantes. Mais alguma informação relevante? Alguma indicação de produtor? Desde já agradeço.

Lembrei que em 2008, no antigo site, havia escrito uma matéria sobre o assunto.

Não creio que tenham ocorrido grandes mudanças com a denominação então.... Recordar é viver

O meu primeiro contato, com este belíssimo e pouco conhecido vinho, se deu na já longínqua década de 70.

Um adido (não sei de que) da embaixada da Itália, após uma estada de alguns anos em Brasília, estava de malas afiveladas e prontas para retornar ao Friuli, sua terra natal.
 

Como todo bom diplomata, ao deixar o país, só não vendeu as cuecas porque naquele tempo estas peças íntimas ainda não eram disputadas em leilão, mas vendeu carro, moveis, quadros, discos e, finalmente, as garrafas de vinhos que repousavam em sua adega nada modesta.

Quando tomei conhecimento, da venda dos vinhos, muitos compradores já me haviam antecipado e, logicamente, comprado os vinhos melhores e mais conhecidos.

Se por um lado tive azar, por outro tive muita sorte.

Sobraram muitas garrafas de "Spumante Brachetto" que ninguém, em Brasília, conhecia.
 

Por um preço quase simbólico arrematei duas caixas de Brachetto, que ninguém queria e passei muitos meses me deliciando com aquele ótimo espumante de uma vinícola cujo nome, confesso, não mais recordo.

Muitos anos se passaram sem que o Brachetto cruzasse novamente o meu caminho.

Foi em 1998, no ótimo restaurante “La Contea", do folclórico Tonino Ferro, em Neive, que o sommelier sugeriu ao meu filho, que pedira um dessert, um cálice de Brachetto.

Todas as memórias deste vinho, como de encanto, retornaram à minha mente e creio seja inútil dizer que o sommelier acabou por nos servir a inteira garrafa.

Já tinha ouvido comentários que o Brachetto, além das versões frisante e espumante doce, era produzido, em menor escala, na versão “fermo” e seco.

 Procurei o Brachetto seco em não sei quantas enotecas sempre sem sucesso e esta minha busca, quase obsessiva, me revelou que poucos italianos conheciam o Brachetto vinificado desta maneira.
 

Quase desisti de ser o Diógenes do Brachetto seco, até que num ensolarado final de manhã, sentado em uma das mesas ao ar livre num bar de Canelli, pedi distraidamente ao garçom um Brachetto.

O jovem que me atendia, indagou: “O senhor prefere espumante ou fermo seco?”. Quase pulei da cadeira e perguntei incrédulo “Você tem o Brachetto seco? Não acredito!”

 O garçom meio assustado com minha reação balbuciou um sim, entrou no bar e voltou com a garrafa.

 Inútil comentar o final, mas devo confessar que tive alguma dificuldade em encontra meu carro no estacionamento...

Deixemos as lembranças de lado e vamos falar desta belíssima uva que já deliciava os romanos que vinham até Acqui para aproveitar as águas termais desta bela cidade da província de Alessandria.

Diz a lenda (os vinhos são cheios de lendas) que Cleópatra recebera muitas ânforas de Brachetto e que nos jantares tentava enfeitiçar Julio Cesar ou Marco Antonio com taças e mais taças deste vinho.

 Lendas à parte o Brachetto já era um sucesso há 2.000 anos.

Com o passar do tempo o Brachetto deixou de ser um vinho da moda provavelmente ofuscado pelo sucesso do Moscato e ficou no ostracismo até o final do século 19.

O definitivo reencontro com a fama se deve, em grande parte, ao famoso viticultor Arturo Bersano que na década de 50 iniciou a vinificação do “Brachetto Spumante”

 Por seu frescor, seus aromas florais e baixo teor alcoólico, o Brachetto é sucesso entre os jovens e é consumido em taças ou em dezenas de cocktails.

Para variar, o mercado americano adotou o Brachetto como novo ícone de sucesso e grande parte da produção é exportada para os EUA. (tomara que mais um vinho não sucumba à ganância dos produtores).

Este vinho da moda se apresenta nas versões: Brachetto d’Acqui, Brachetto d’Acqui Spumante, Brachetto Passito e Brachetto Secco.

Somente as duas primeiras denominações podem ostentar a DOCG. As outras, devem obrigatoriamente adotar um nome fantasia.

O Brachetto d’Acqui (espumante ou não), que conseguiu sua DOC em 1969 e a DOCG em 1996, é produzido 100% com uvas homônimas plantadas e colhida nos quase 1000 hectares espalhados por 18 municípios da província de Asti e 8 da província de Alessandria.

O Brachetto deve ter obrigatoriamente 11,5º, apresentar cor rubi claro (quase rosada), aroma floral onde sobressaem a rosa e violeta e no paladar se apresenta doce, macio, muito delicado e fácil de beber.

È um vinho típico de sobremesa que se harmoniza perfeitamente com os doces piemonteses.

Falando de Brachetto, não podia deixar de apresentar alguns dados sobre as tipologias mais famosas e consumidas, mas meu objetivo principal é o extraordinário Brachetto, em sua versão “Secco”.

O Brachetto seco (bom) é produzido em quantidades mínimas e quase exclusivamente para os poucos que conhecem os raros produtores e que apreciam este quase desconhecido vinho.

Eu sou um destes raros admiradores, assim como sou do Gamba di Pernice,Carema, Pelaverga, Lessona, Sfursat, Incrocio Manzoni, Moscato di Scanzo, Rossese di Dolceaqua e muitos outros que bebedores de "vinhos internacionais" (Cabernet Sauvignon, Merlot, Chardonnay etc.), nem sonham ou procuram conhecer.

Indico, sem o menor receio de errar, o Liona da “Azienda Vinicola Marina Mangiarotti” de Strevi em Província de Alessandria

O “Rosso Eli” de Elisabetta Castellucci, no distrito de Moirano D’Acqui, é produzido com uvas colhidas em ½ hectare, que resultam, no final, em apenas 500 garrafas. O “Rosso Eli” se apresenta com uma bela cor cereja, aroma delicado, muito frutado e seu natural frescor esconde, facilmente, seus 13º de álcool.
 

O Brachetto La Tia, produzido por “Poderi Traversa” em Spigno Monferrato, é outro belo vinho que apresenta um aroma que evidencia especiarias, a rosa e com seus 12º, é ótimo para acompanhar os embutidos locais.

Quando, ou por acaso, o leitor passar por Acqui, há poucos metros da “Bollente”, famosa fonte de águas termais, bem no centro da principal praça da cidade, deve procurar a enoteca “La Curia” (procurar também na "Enoteca Regionale Acqui Terme")
 

 Neste belíssimo local, além de uma quantidade incrível de vinhos é possível conhecer o Brachetto Secco, é só pedir.

Bacco

5 comentários:

  1. Interessante artigo sobre este tipo de vinho, vou procurar .... Outro dia arrematei umas caixas do Umani Ronchi Maximo botritizado, nunca havia tomado este tipo de vinho produzido na Itália e surpreendeu muito, se conhece outros vinhos assim por favor exponha.

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  2. Não acredito muito na Botrytis italiana. Há na verdade muita picaretagem. O grande vinho , no gênero, é o Tokay. Na Itália tente o "muffato" de Orvieto de Palazzone e se encontrar (duvido) o Picolit de Marco Sara. O Picolit é uma joia enológica. Outro é o Torcolato de Maculan e finalmente o Passito di Pantelleria. Se quiser tenho antigas matérias sobre o Picolit.

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  3. Realmente, tomar o vinho do gênero Botrytis a beira do lago Balaton na Hungria é uma experiência ímpar....
    Aliás, há excelentes brancos secos, principalmente de Tramminer que valem cada gota, tem bom custo-benefício e vale colocar na mala.
    Um passeio que vale a pena.

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  4. Muito interessante Bacco! Certamente será mais prazeroso abrir o Brachetto conhecendo essa contexto. Grazie mille!

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