Um leitor de B&B escreveu o seguinte comentário na matéria
"Gattinara Nervi"
1.
Sobre denominações não usuais, o que me diz da
Brachetto, Bacco? Comprei recentemente uma garrafa pela curiosidade e sem nunca
ter ouvido falar. Depois, percebi que a graduação alcóolica era bem fora dos
padrões para um tinto (5,5%) e que a uva pode dar origem a vinhos tranquilos ou
espumantes. Mais alguma informação relevante? Alguma indicação de produtor?
Desde já agradeço.
Lembrei que em 2008, no antigo site, havia escrito uma matéria
sobre o assunto.
Não creio que tenham ocorrido grandes mudanças com a denominação
então.... Recordar é viver
O meu primeiro contato, com este belíssimo e pouco conhecido vinho, se
deu na já longínqua década de 70.
Um adido (não sei de que) da embaixada da Itália, após uma estada de
alguns anos em Brasília, estava de malas afiveladas e prontas para retornar ao
Friuli, sua terra natal.
Como todo bom diplomata, ao deixar o país, só não vendeu as cuecas
porque naquele tempo estas peças íntimas ainda não eram disputadas em leilão, mas
vendeu carro, moveis, quadros, discos e, finalmente, as garrafas de vinhos que
repousavam em sua adega nada modesta.
Quando tomei conhecimento, da venda dos vinhos, muitos compradores já me
haviam antecipado e, logicamente, comprado os vinhos melhores e mais
conhecidos.
Se por um lado tive azar, por outro tive muita sorte.
Sobraram muitas garrafas de "Spumante Brachetto" que ninguém,
em Brasília, conhecia.
Por um preço quase simbólico arrematei duas caixas de Brachetto, que
ninguém queria e passei muitos meses me deliciando com aquele ótimo espumante
de uma vinícola cujo nome, confesso, não mais recordo.
Muitos anos se passaram sem que o Brachetto cruzasse novamente o meu
caminho.
Foi em 1998, no ótimo restaurante “La Contea", do folclórico Tonino
Ferro, em Neive, que o sommelier sugeriu ao meu filho, que pedira um dessert,
um cálice de Brachetto.
Todas as memórias deste vinho, como de encanto, retornaram à minha mente
e creio seja inútil dizer que o sommelier acabou por nos servir a inteira
garrafa.
Já tinha ouvido comentários que o Brachetto, além das versões frisante e
espumante doce, era produzido, em menor escala, na versão “fermo” e seco.
Procurei o Brachetto seco em não
sei quantas enotecas sempre sem sucesso e esta minha busca, quase obsessiva, me
revelou que poucos italianos conheciam o Brachetto vinificado desta maneira.
Quase desisti de ser o Diógenes do Brachetto seco, até que num
ensolarado final de manhã, sentado em uma das mesas ao ar livre num bar de Canelli, pedi distraidamente ao garçom um Brachetto.
O jovem que me atendia, indagou: “O senhor prefere espumante ou fermo seco?”. Quase pulei da cadeira e perguntei incrédulo “Você tem o Brachetto seco? Não acredito!”
O garçom meio assustado com minha
reação balbuciou um sim, entrou no bar e voltou com a garrafa.
Inútil comentar o final, mas devo
confessar que tive alguma dificuldade em encontra meu carro no
estacionamento...
Deixemos as lembranças de lado e vamos falar desta belíssima uva que já
deliciava os romanos que vinham até Acqui para aproveitar as águas termais
desta bela cidade da província de Alessandria.
Diz a lenda (os vinhos são cheios de lendas) que Cleópatra recebera
muitas ânforas de Brachetto e que nos jantares tentava enfeitiçar Julio Cesar
ou Marco Antonio com taças e mais taças deste vinho.
Lendas à parte o Brachetto já era
um sucesso há 2.000 anos.
Com o passar do tempo o Brachetto deixou de ser um vinho da moda
provavelmente ofuscado pelo sucesso do Moscato e ficou no ostracismo até o
final do século 19.
O definitivo reencontro com a fama se deve, em grande parte, ao famoso
viticultor Arturo Bersano que na década de 50 iniciou a vinificação do “Brachetto Spumante”
Por seu frescor, seus aromas
florais e baixo teor alcoólico, o Brachetto é sucesso entre os jovens e é consumido
em taças ou em dezenas de cocktails.
Para variar, o mercado americano adotou o Brachetto como novo ícone de
sucesso e grande parte da produção é exportada para os EUA. (tomara que mais um
vinho não sucumba à ganância dos produtores).
Este vinho da moda se apresenta nas versões: Brachetto d’Acqui,
Brachetto d’Acqui Spumante, Brachetto Passito e Brachetto Secco.
Somente as duas primeiras denominações podem ostentar a DOCG. As outras,
devem obrigatoriamente adotar um nome fantasia.
O Brachetto d’Acqui (espumante ou não), que conseguiu sua DOC em 1969 e
a DOCG em 1996, é produzido 100% com uvas homônimas plantadas e colhida nos
quase 1000 hectares espalhados por 18 municípios da província de Asti e 8 da
província de Alessandria.
O Brachetto deve ter obrigatoriamente 11,5º, apresentar cor rubi claro
(quase rosada), aroma floral onde sobressaem a rosa e violeta e no paladar se
apresenta doce, macio, muito delicado e fácil de beber.
È um vinho típico de sobremesa que se harmoniza perfeitamente com os
doces piemonteses.
Falando de Brachetto, não podia deixar de apresentar alguns dados sobre
as tipologias mais famosas e consumidas, mas meu objetivo principal é o
extraordinário Brachetto, em sua versão “Secco”.
O Brachetto seco (bom) é produzido em quantidades mínimas e quase
exclusivamente para os poucos que conhecem os raros produtores e que apreciam
este quase desconhecido vinho.
Eu sou um destes raros admiradores, assim como sou do Gamba di
Pernice,Carema, Pelaverga, Lessona, Sfursat, Incrocio Manzoni, Moscato di
Scanzo, Rossese di Dolceaqua e muitos outros que bebedores de "vinhos
internacionais" (Cabernet Sauvignon, Merlot, Chardonnay etc.), nem sonham
ou procuram conhecer.
Indico, sem o menor receio de errar, o Liona da “Azienda Vinicola Marina
Mangiarotti” de Strevi em Província de Alessandria
O “Rosso Eli” de Elisabetta Castellucci, no distrito de Moirano D’Acqui,
é produzido com uvas colhidas em ½ hectare, que resultam, no final, em apenas
500 garrafas. O “Rosso Eli” se apresenta com uma bela cor cereja, aroma delicado,
muito frutado e seu natural frescor esconde, facilmente, seus 13º de álcool.
O Brachetto La Tia, produzido por “Poderi Traversa” em Spigno
Monferrato, é outro belo vinho que apresenta um aroma que evidencia
especiarias, a rosa e com seus 12º, é ótimo para acompanhar os embutidos
locais.
Quando, ou por acaso, o leitor passar por Acqui, há poucos metros da
“Bollente”, famosa fonte de águas termais, bem no centro da principal praça da
cidade, deve procurar a enoteca “La Curia”
(procurar também na "Enoteca Regionale Acqui
Terme")
Neste belíssimo local, além de
uma quantidade incrível de vinhos é possível conhecer o Brachetto Secco, é só pedir.
Bacco
Interessante artigo sobre este tipo de vinho, vou procurar .... Outro dia arrematei umas caixas do Umani Ronchi Maximo botritizado, nunca havia tomado este tipo de vinho produzido na Itália e surpreendeu muito, se conhece outros vinhos assim por favor exponha.
ResponderExcluirMaravilha!
ResponderExcluirNão acredito muito na Botrytis italiana. Há na verdade muita picaretagem. O grande vinho , no gênero, é o Tokay. Na Itália tente o "muffato" de Orvieto de Palazzone e se encontrar (duvido) o Picolit de Marco Sara. O Picolit é uma joia enológica. Outro é o Torcolato de Maculan e finalmente o Passito di Pantelleria. Se quiser tenho antigas matérias sobre o Picolit.
ResponderExcluirRealmente, tomar o vinho do gênero Botrytis a beira do lago Balaton na Hungria é uma experiência ímpar....
ResponderExcluirAliás, há excelentes brancos secos, principalmente de Tramminer que valem cada gota, tem bom custo-benefício e vale colocar na mala.
Um passeio que vale a pena.
Muito interessante Bacco! Certamente será mais prazeroso abrir o Brachetto conhecendo essa contexto. Grazie mille!
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