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quarta-feira, 13 de dezembro de 2017

HISTÓRIAS - ORNELLAIA



 


Desejava, há algum tempo, escrever passagens, engraçadas ou interessantes, de minhas viagens pelos territórios das vinhas e dos vinhos.
 
 
 
 

 "O Primeiro Ornellaia a Gente Nunca Esquece" é a matéria que inaugura uma série que apresentarei, mensalmente, no blog.

Boa leitura

"O PRIMEIRO ORNELLAIA A GENTE NUNCA ESQUECE"

Era o início dos anos 2000.

Já havia percorrido várias regiões vinícolas, mas ainda não "dominava" as vinhas da Maremma e seus famosos "Supertuscans".
 
 

Piemonte, Lombardia, Toscana, Veneto, Friuli- Venezia Giulia, Tentino- Alto Adige, Liguria, Emilia Romagna, Umbria, Toscana, Marche, Abruzzo, regiões que percorrera diversas vezes, já não tinham mais mistérios, mas a Maremma era, ainda, uma ilustre desconhecida.

Quem acredita que passear, por exemplo, por Alba e região já é suficiente para ser considerado "doutor" em Piemonte, precisa botar as barbas de molho e entender que cada região italiana é composta por muitas e importantes sub-regiões.

Exemplos.

Piemonte: Langhe, Astigiano, Basso Monferrato, Alto Monferrato, Roero, Alto Piemonte etc.

Veneto: Valpolicella, Colli Euganei, Conegliano- Valdobbiadene (Prosecco) etc.

Toscana: Chianti, Chianti Classico, Montalcino, Montepulciano, Bolgheri..... Pois é, faltava Bolgheri.
 

A meteorologia previa uma semana de frio, chuva e neve em Bolgheri e toda a Maremma.

Ótimo!

Nada melhor do que chuva, frio e neve para espantar as multidões de turistas e percorrer, tranquilamente, territórios badalados.

Além de conhecer Bolgheri, seus caríssimos e premiados vinhos, outro endereço aguçava minha curiosidade e estava em minha mira: "Gambero Rosso".
 

"Gambero Rosso", para quem não sabe , foi considerado e aclamado, durante longos anos, o melhor restaurante da Itália (muitos o consideram o melhor de sempre).

O "Gambero Rosso" nasceu e morreu em uma casa, sem charme algum, no porto de San Vincenzo.

San Vincenzo, cidade esquálida e sem graça, sobrevive e bem, por três razões: O porto, lotado de barcos de luxo, a praia de areias finas e a gastronomia.


Além do "Gambero Rosso" havia e há, em San Vincenzo, uma meia dúzia de ótimos endereços eno-gastronômicos (Zanzibar em primeiro lugar...)

"Boa tarde. É possível reservar uma mesa para um?"

Normalmente a resposta seria negativa, mas a neve e o frio haviam afugentado todos os clientes e...... Sim,  a mesa para o jantar estava confirmada.

Pontualmente, às oito horas e diante dos olhares incrédulos dos cozinheiros, entrei na cozinha do "Gambero Rosso".

 

Fulvio Pierangelini, chef e proprietário do restaurante, do alto de seus 1,90, me olhou como se eu fosse um ET e me fulminou com o olhar

"A entrada do restaurante é pelo porto".

Antes que uma panela me atingisse pedi desculpas, pelo ato falho e me dirigi para o ingresso indicado

O "Gambero Rosso" era diferente até no acesso: A porta da cozinha dava diretamente para calçada da rua principal e o ingresso do restaurante se escondia no passeio do porto.

 

Resolvido o impasse fui recebido com classe e gentileza na pequena e elegante sala daquela catedral gastronômica.

Apenas dois casais ocupavam outras mesas além daquela que me fora reservada.

Observador, notei que o casal, da mesa no canto da sala, não parecia ser exatamente, apreciador da refinada culinária do "Gambero Rosso".....

Percebi que o homem, de meia idade, com uma arroba de gordura em excesso, careca, espalhafatoso e falante, tentava impressionar e conquistar uma loira (russa?), um palmo mais alta e 35 anos mais nova.

 

Não precisei me esforçar para ouvir o Casanova ordenar, ao sommelier da casa, um "Ornellaia".

Consultei a carta de vinhos, que o sommelier deixara em minha mesa e verifiquei que nosso rotundo conquistador não queria economizar: Ornellaia=270 Euros.

O sommelier anotou o pedido, trocou as taças por outras maiores e mais importantes, foi até a adega e retornou, triunfante, trazendo a garrafa de 270 Euros.

Com toda a pompa e cuidado, que uma etiqueta repleta de Euros exige , abriu a garrafa , provou , aprovou o vinho e sorridente serviu o Casanova esperando seu veredicto.

 

"Não está bom!"

O sorriso desapareceu da face do sommelier e o profissional ficou petrificado quando nosso conquistador esbravejou: "Espero que a próxima seja uma garrafa perfeita".

Quase correndo e tropeçando, o rapaz voltou à adega e poucos minutos depois retornou com uma nova garrafa de "Ornellaia"

Mesmo ritual, mesmo cuidado e...... "Será possível que você não consegue encontrar uma garrafa, decente, na adega".

 

O sommelier, lívido e com os olhos quase saindo das orbitas , saiu da sala, literalmente, correndo.

Minutos depois os abundantes cachos e os 1,90 metros de Fulvio Pietrangelini, carregando as duas garrafas de "Ornellaia", se aproximaram da mesa do Casanova.

"As duas garrafas estão perfeitas, o senhor não entende merda nenhuma de vinho e está querendo apenas aparecer. O melhor e desaparecer, agora, antes que eu me zangue. Levante e saia do meu restaurante".

 

Sem protesto, sem resposta, calado, o casal vestiu os capotes e sumiu na noite gelada.

Pietrangelini parou bem à minha frente e com olhar, ainda, ameaçador perguntou; "O senhor gosta de "Ornellaia"?

Respondi afirmativamente (não tive coragem de declarar a minha preferência pelo Brunello).

O cozinheiro gigante deixou a garrafa na minha mesa e exclamou: "Então beba, o quanto quiser, por minha conta".

 

Graças a um ridículo Casanova, naquela noite, a ótima cozinha do Gambero Rosso foi regada com o caríssimo Ornellaia.

Continua

Bacco

6 comentários:

  1. o melhor Ornellaia é o que é pago pelos outros. sem dinheiro público, de preferência.

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  2. Parla, B.

    Como esta o mercado dos supertoscanni depois que russos e chineses tivem que dar uma freada nos presentinhos para politicos? Acharam outros trouxas para pagar fortunas por cabernets feitos no noroeste italiano?

    Perdoes aos tomadores de rotulo...mas passo longe desses superstucans.

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  3. Bacco, encontrei e comprei uma Freisa da Antica Casa Scarpa, conhece o produtor? O que acha?

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  4. Encontrou ? Onde? A Scarpa produz grandes vinhos e sua Freisa é ótima. Quanto pagou?

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  5. Ótimo, bom saber, obrigado. Encontrei na importadora Garage, comprei também um Barbera que já experimentei e estava ótimo. Ambos +R$100,00, sendo o Freisa mais caro.

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