Quando jovem tinha a sensação de tudo poder, sensação que me
fazia transpirar presunção e vaidade.
A juventude fornecia aquela certeza de um poder sem limite e de
que nada, ninguém, poderia deter minha caminhada
Praticante de judô, com muitas vitorias em torneios regionais
e recém-chegado a Brasília, resolvi abrir uma academia que em pouco tempo se
transformou no “point” dos praticantes de artes marciais da capital.
A presunção e a onipotência chegaram a tal ponto que uma tarde
resolvi visitar a academia, recém-inaugurada, de nosso maior judoca, daqueles anos:
Lhofei Shiozawa.
Minha intenção era
testar a força de Shiozawa e, quem sabe, tentar vencê-lo.
Quimono vestido, cumprimentos de praxe e... “desafiei”, para
um treino, o campeão Pan-americano.
Não recordo quantas vezes, em menos de dois minutos, Shiozawa
me fez “voar”, mas lembro que, naquela tarde e durante muitos anos, minha
presunção de invencibilidade se estabilizou em níveis normais.
Foi preciso que Lhofei Shiozawa me ensinasse a cantar “Fly Me To The Moon” para que eu “caísse na real”.
https://www.youtube.com/watch?v=1mREXqk0FeQ
O que tem o judô, Shiozawa e a “Fly Me To
The Moon” com vinho, gastronomia, eno-turismo etc.?
Muito!
Já perceberam o quanto algumas pessoas são insuportavelmente
presunçosas quando resolvem revelar, durante uma reunião, jantar, encontro,
confraria, etc. seus profundos conhecimentos vinícolas?
Não há saco que aguente.....
O pior é quando o eno-presunçoso, desfilando um rosário de
aromas, sabores, retro gostos, terroir, barriques, toneis, potencialidade de
guarda, harmonizações, estruturas etc. etc. etc. acredita, piamente, que sua
“cultura” vinícola hipnotize e encante a plateia.
A vaidade não permite
que o eno-chato perceba o enfado e bocejos dos presentes que, quase sem
esperanças, aguardam o fim da narrativa para beber, tranquilamente, uma taça de
vinho.
A eno-presunção e um dos piores e insuportáveis “defeitos” do
enófilo.
Semana passada, ao escrever a matéria: “O Enófilo Brasileiro é Antes de
Tudo um Forte”, surgiu um Shiozawa das vinhas que deu um “Ippon” em
minha presunção vinícola.
Morei no Piemonte anos a fio, explorei inúmeras DOC e DOCG
piemontesas, fiz das vinhas e vinhos locais minha “pièce de résistance”, degustei
e comentei garrafas que pouquíssimos enófilos brasileiros conheciam e já acreditava
tudo saber.
Lembram da canção “O Bom” de Eduardo Araújo?
Pois é.... “...ele é o bom é o
bom é o bom...” seria o refrão mais apropriado para a minha mais
nova e insensata presunção: A presunção vinícola.
Tudo ia bem, mas eis porém que de repente (Piston na Gafieira).....Albarossa, Arneis, Avanà, Baratuciat, Barbera, Becuet, Bian Ver,
Bonarda, Bussanello, Cari, Caricalasino, Cortese, Croatina, Dolcetto, Erbaluce,
Favorita, Freisa, Gamba di pernice, Grignolino, Malvasia, Malvasia di
Schierano, Malvasia moscata, Montanera, Moscato, Nascetta, Nebbiolo, Nebbiolo
di Dronero, Neretto di San Giorgio, Pelaverga, Pelaverga Piccolo, Quagliano, Rossese
bianco, Ruchè, Slarina, Timorasso, Uva rara, Uvalino, Vespolina.......
Ao ler a relação, das 38 castas autóctones do Piemonte, que serão
degustadas em Alba no dia 26 de maio, constatei, estupefato, que não conhecia e
nem tinha ouvido falar de nada menos do que 13 delas.
Em nome de Fufluns!
Eu, “O Bom”, desconhecia quase 35% dos
vinhos elencados.
Nunca havia ouvido falar de Baratuciat,
Becuet, Bian Ver, Bussanello, Cari, Malvasia di Schierano, Malvasia Moscata,
Montanera, Neretto di San Giorgio, Pelaverga Piccolo, Quagliano, Slarina,
Uvalino.
Encontrei consolo quando, livre de toda presunção, me auto absolvi “Tudo bem, tudo bem... é impossível
conhecer todas as variedades…. ”
Mesmo após a “absolvição” uma nuvem de depressão despontou em meu
horizonte vinícola, mas prontamente desapareceu quando me perguntei: “Se você não conhecia a Baratuciat, Becuet, Bian Ver, Bussanello,
Cari, Malvasia di Schierano, etc. Imagine
quantas centenas de outras variedades não fazem parte do repertorio dos
sommelier, críticos, influencers, jornalistas, diretores da AB$”
Uma moderada presunção pediu licença para voltar à minha mente...
Resumindo....
Listas, concursos, guias, influencers, críticos, revistas, sommelier, comentando,
indicando, analisando, pontuando etc. os melhores espumantes, tintos, rosados,
brancos, da França, Portugal, Espanha, Itália, Chile Nova Zelândia, Argentina, África
do Sul....fuja imediatamente é pura picaretagem;
ninguém conhece todos os vinhos do mundo para saber qual o melhor ou pior.
Já é difícil conhecer todas as variedades do Piemonte imagine, então,
ser íntimo das castas do mundo todo.
Confie em você, em seu nariz, paladar, seu repertorio e....seu bolso.
Bacco
Post muito legal, Bacco! Concordo plenamente! Sempre tem alguém que sabe mais que a gente, e geralmente, são milhares. Muito boa a sua analogia com sua experiência no Judô. Vivenciei algo parecido quando me mudei para a cidade de São Paulo e fui treinar Karatê com o Sensei Sasaki. Quase desmaiei no primeiro treino. Sem contar as binfas que levei de seus alunos menos graduados. Caí na real em minutos. C’est la vie.
ResponderExcluirArigatô
ExcluirPor que foi morar no Piemonte? Causa vitivinícola ou alguma motivação laboral? De qualquer forma, ingressou numa cultura vinícola complexa, ainda não conspurcada pelo capital explorador como na Toscana e outras paragens, de elevada qualidade e variedade, e numa região ainda não assassinada pelo turismo predatório. Parabéns.
ResponderExcluirHavia muitos parentes no Piemonte, então.....
ResponderExcluirRaízes, um bom motivo
ExcluirE tem também, durante a reunião, aquele que no clímax de sua degustação faz um bico circense
ResponderExcluirBico circense é aquele tipo "cu de galinha"?
ExcluirBico circense é aquele tipo "cu de galinha"?
ExcluirExatamente
ExcluirMas sabe, Bacco, esses enochatos presunçosos hoje migraram, não dão mais bobeira nas mesas. Perceberam que as redes sociais fazem render. Fazem um curso ABS e se lançam como “experts do vinho” nas redes sociais, recomendando vinhos, taças, abrindo rótulos caros, explicando o termo “reservado”, inúmeros videozinhos para acabar com o preconceito contra o vinho brasileiro e metem um post fixado “ o melhor vinho é aquele que você mais gosta”. Pronto, arrebanham uma multidão de cretinos
ResponderExcluirMatou.... Exatamente o que está acontecendo
ExcluirÉ um dos males das redes sociais, a pessoa com voz no assunto não necessariamente é a especialista e sim aquela que conseguiu, de uma maneira ou de outra, cair nas graças do grande público. Vale pros vinhos, medicina, finanças e um longo etc
ExcluirNo caso dos vinhos, o influencer mete o vinho top-merda dessas vinícolas-boutique do bananal num cenário lindo de almoço de domingo e narra com bicos e gemidos que aquela tremenda bosta deveria ser tomada é de conta-gotas. Vixe nossa, virou clichê, e o que tem de debilóide que sai comprando não está no gibi. Compram, por exemplo, um “Seis-marias” de 900 reais quando poderiam ter comprado 2 ou 3 bons Barolos. É assim que as vinícolas nacionais estão desencalhando os top-merdas de 900 reais de suas adegas..
ExcluirNinguém consegue saber de tudo, então é normal que uma pessoa que não viva o mundo dos vinhos não entenda bem de preços e qualidade, entretanto, com a Internet não há desculpas para não se informar sobre o mínimo. Não leva mais de 5 minutos pra saber, ou ao menos suspeitar, que 900 reais em vinho nacional não soa correto. Aí nem culpo o influencer, culpo a preguiça de quem compra.
ExcluirEntão, conceituou enolóide
ExcluirNenhum vinho nacional deveria custar mais do que R$ 100. Um centavo a mais é roubo.
ResponderExcluirValuation freestyle. Assombroso.
ExcluirNenhum vinho no mundo deveria custar mais do que 100 dólares/euros
ExcluirSugiro que os sabichões que sabem quanto deveria custar uma garrafa de vinho ao consumidor final (maximo), que comprem terra, equipamentos, contratem funcionários e comecem a produzir e vender vinho. Tudo abaixo de R$ 100 ou U$D 100 caso sejam residentes além-mar. Vamos, precisamos de voces.
ExcluirSe fabrica vinhos em Portugal, custo de insumos e mão de obra em Euros (muito mais caros), se atravessa um oceano (frete muito mais elevado), se paga fee pra importadora (custo agregado), é preciso lidar com a burocracia de alfândega, custos contábeis tributários entre países etc
Excluire conseguem trazer coisas infinitamente melhores que os nacionais por R$70 ao consumidor final. Citei Portugal como exemplo, mas poderia facilmente ser Espanha, vou nem falar dos Vizinhos. O vinho nacional de qualidade razoável custar o que custa é patético. Eu entendo o empresário do setor têxtil não conseguir competir com a China que tem um exército de trabalhadores quase máquinas produzindo 6 dias por semana por um salário irrisório, mas aqui falamos de Europa. As vinicolas Brasileiras não cobram esse preço aberração por fatores de custo e sim por ganância em cima de consumidor mal informado, com isso não há defesa. Toda crítica é pouca.
Obrigado, você me poupou o trabalho de responder ao abnegado produtor de quase vinhos nacionais
ExcluirPessoal aqui acha que qualquer vinho nacional custa o mesmo que o ave marias ou o vinho ''top'' do lidio ex-carraro ou o estalento da assalton. Engano preconceituoso. Há muito vinho no sul com preço e qualidade decentes. Azar de quem só enche a paciência e nem procura se informar melhor.
ExcluirCaro Sherlock dos vinhos do sul , poderia imformar onde encontrar suas pérolas vinícolas e qual o preço?
ExcluirPodem passar um dia conjecturando que não vão achar algo que explique alguém pagar 900 reais num Miolo, ou em outras aberrações desses "top" nacionais. E pagam até mais. Eu sei que existem os compradores, porque existem os vinhos.
ResponderExcluirDesde q acompanho o site, blog, 2006 talvez, sem puxa-saquismo, Bacco dá pouca margem para enolóide e picareta da categoria, fico animado de Blog atual sacudir um pouco mais o pandeiro
ResponderExcluirAnônimo da matéria anterior falou sobre vinhos subaquáticos, legal ler a matéria de 2014: “ O vinho do capitão Nemo”, de Bocca.
ResponderExcluirA figura do enolóide está bem caracterizada no desfecho da matéria..
ResponderExcluirApenas uma declaração, sem nenhuma pretensão e pouca relação com este post. Não gosto da cepa Sangiovese. Meu primeiro contato qualificado com o vinho ocorreu quando fui fazer um curso de italiano aplicado em Florença, no distante 1990. Uma das temáticas base eram os vinhos da região. Continuei a preferir a birra Moretti por um bom tempo nos encontros com colegas de classe. Aliás, todos preferiam. Chianti era sem graça e Brunello de Montalcino era algo chato e caro. Nunca estava bom, ou porque abríamos a garrafa antes ou depois do momento correto. Nunca no momento certo. Outras opções foram aparecendo, vindas da França e a birra ficou no passado. Daí chegaram com sucesso o Piemonte, a Sicília, Sardenha e até a Campania. Mas até hoje tenho um pé atrás com a Sangiovese. Será real ou fóbico este mau gosto? Comprei algumas garrafas de Chianti e outras da Emília Romagna e Umbria com a dita cuja, para testar. Espero me divertir tentando.
ResponderExcluirBrunello bom tem que pagar caro. E ainda assim corre o risco de comer Pablo vittar por coelhinha. Difícil achar "O" brunello por preços razoáveis. Nunca consegui.
ExcluirA partir de 40 Euros já tem Brunello muito bom. Subiram bastante, mas ainda acha.
ExcluirIniciei a vida etílica no mundo da cerveja, mas sou apaixonado por vinhos tambem. Fico sempre muito feliz quando vejo novas publicações por aqui. Os textos provocativos, as vezes ácidos, se prestam (e muito) a abalar as estruturas do senso comum e valem cada segundo do meu tempo. 👏🏻
ResponderExcluirOlá amigos! Aqui fala seu colega connoisseur, tenho o prazer de compartilhar essa matéria da renomada CNN com novidades inusitadas e criativas de nossas vinicolas gaúchas. Tim Tim!
ResponderExcluirhttps://www.cnnbrasil.com.br/viagemegastronomia/gastronomia/vinicolas-gauchas-apostam-em-criatividade-e-produzem-blend-inedito-no-brasil/
Olá amigos! Aqui fala seu colega connoisseur, tenho o desprazer de anunciar que devido a situacao no RGS, vão faltar vinhos nacionais e a tendência nos preços seria de mais altas. Estamos ferrados.
ResponderExcluirEstamos ferrados? Apesar de triste com o que aconteceu no RS, agradeço a falta dos quase vinhos nacionais
ExcluirOlá amigos! Aqui fala seu colega connoisseur (o verdadeiro), para mim esse vinho brunello do qual vocês tanto falam aquilo não chega ao fundo da garrafa do Guaspari Terroir - Pinot Noir 2018. Um pedacinho do céu. Tim Tim!
ResponderExcluirAqui fala o connoisseur real, roubaram minha identidade, mas tudo bem, não posso ser o único connoisseur no mundo, brindemos ao bom gosto!
ExcluirB&B, degustação aconteceu aí em Brasília. Uma pechincha kkkk
ResponderExcluirDegustação vertical de 11 safras do vinho Pêra-Manca tinto:
https://blogs.correiobraziliense.com.br/conversandosobrevinho/2024/05/06/degustacao-vertical-de-11-safras-do-vinho-pera-manca-tinto/
Olá amigos! Aqui fala seu colega connoisseur, o verdadeiro. Quem é o engraçadinho se passando por mim? Hoje vou tomar um néctar dos deuses, um vinho Pizzato merlot 2003. Ha anos afinando, só melhorando. Tim tim!
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