Facebook


Pesquisar no blog

domingo, 20 de outubro de 2019

ROMANÉE-BIONDI 2


O assunto parece não esgotar: “Vinhos Velhos”

Recentemente, nosso velho conhecido, Jean Claude Cara-de-Pau, tentando sobreviver, agora, no papel de “caviste”, desembarcou no país, que consome 1,6 litros per capita/ano, trazendo um sarcófago repleto de vinhos anciãos.

 Quando abriu o esquife, cheio de garrafas mofadas e catadas em adegas-tumbas de Beaune e arredores, alguns blogueiros, sommeliers, formadores de opinião e convidados, babando e suspirando, mal conseguiram disfarçar o orgasmo.

 É o paraíso dos enoloide.

Qual o fascínio, qual a atração fatal que os consumidores sentem pelos vinhos velhos?

Será que a atração fatal tem origem naquela antiga e tola máxima: “O vinho quanto mais velho, melhor….”?

Eu, Dionísio, nunca consegui beber um vinho com mais de 30-35 anos que deixasse saudade.

A melhor definição, sobre velhas garrafas, como sempre, foi de Massimo Martinelli: “O vinho muito velho perde suas melhores características, mas ganha emoções”.

Está certo, Martinelli, quando afirma haver muito mais emoção do que razão, mas quase sempre a emoção é soterrada pela decepção.

Martinelli afirma que uma única vez bebeu um vinho com 40 anos em perfeito estado de conservação e com suas características preservadas: Barolo Bussia de Aldo Conterno.

Qual o mistério então dos míticos franceses, do Brunello Biondi Santi e outros, que permanecem vivos e perfeitos mesmo depois de 60-70-80 anos? (A Biondi Santi sempre alardeou que seu Brunello ainda está vivo mesmo aos 100 anos).

É preciso, antes de tudo, não ser enoloide ao ponto de acreditar, piamente, que os Biondi Santi, os grandes Château de Bordeaux, os Romanée, Frescobaldi, Rothschild etc. da vida, são viticultores que trabalham em suas vinhas de sol a sol, que acompanham dia e noite todas as etapas de vinificação e que, por sua abnegação e duro trabalho, suas vinhas foram ungidas pelo Deus Baco.

Enoloide, acorde!

Nossos amigos, que de abnegados não tem nada, são todos nobres, empresários, banqueiros, industriais, comerciantes etc. riquíssimos e que fizeram do vinho, graças aos endinheirados enoloides, uma das atividades mais rentáveis do planeta.

Uma garrafa de Brunello, engarrafada, etiquetada, tampada, embalada, pronta, enfim, custa, no máximo, 9/12 Euros seja ela Biondi Santi, Capanna, Canalicchio di Sopra ou outra qualquer.

O ótimo Brunello “Sasso di Sole” custa 30/35 Euros e o Biondi Santi 130/140.

O Biondi Santi é melhor?

Para bebedores de etiqueta, sim.

  Eu não acho e nada justifica a diferença de 400% no preço.

É mais ou menos o mesmo discurso das bolsas, sapato, roupas de grife, que custam os olhos da cara e que são produzidas em Napoli, China, Índia, Vietnam etc.

Você pode até ter problemas para saldar suas contas no final do mês, mas contribui, orgulhoso, para a boa vida dos Louis Vuitton, Biondi Santi, Romanée-Conti, Ermenegildo Zegna, etc. etc. da vida.

Quando você, finalmente, deixar de ser um enoloide que acredita em pontos, prêmios, “Wine Especuleitor” etc., estará pronto para deixar de usar KY e partir para a próxima etapa: Beber vinho e não etiqueta.

Você perguntará: “Se a Biondi Santi vende o Brunello de 1955, por 9.200 Euros, o vinho, de 64 anos, obrigatoriamente deve estar em ótimas condições ”

Sim, concordo, mas qual o “milagre” que só a Biondi Santi consegue realizar?

É preciso ir além de um ridículo curso como o “Entre Tapas e Copos”, “WSET Desnível 3” ou outra arapuca qualquer.

E preciso pesquisar, ler, viajar e conhecer o caminho das pedras.

A Biondi Santi, desde 1927, adota a “ricolmatura” das garrafas mais antigas guardadas em suas adegas.

 É bom lembrar que a quantidade de garrafas estocadas ninguém sabe, pois somente em 1960 o Brunello consegue a DOC e em 1980 a DOCG.

Os controles, antes das datas acima, inexistiam e a Romanée-Biondi está livre para inventar a quantidade e as safras que quiser.

O que é “ricolmatura”?

Com o passar dos anos, a rolha perde elasticidade e o vinho evapora lentamente.

A “ricolmatura” é uma operação em que a rolha velha é substituída por uma nova e se completa a garrafa com um pouco de vinho da mesma safra

A Biondi Santi jura de pés junto que é apenas isso.

Um enoloide pode até acreditar, mas eu, não.

No livro “Vino al Vino”, Mario Soldati, descreve um encontro com Venanzio Sella, proprietário da “Tenute Sella”.

Os Sella, banqueiros, industriais, comerciantes etc., entre outras coisas, são produtores de vinho, em Lessona, desde 1671.

Soldati, no decorrer da conversa, comenta que, na visita aos Biondi Santi, provara vinhos de 50-70-80 anos e que o Brunello realmente era o vinho mais longevo da Itália.

Venanzio, com um sorriso malicioso, responde que ele também poderia produzir vinhos centenários, para tanto seria preciso apenas usar a fórmula que os Biondi Santi haviam “inventado” em 1927: De tempo em tempo basta, não somente completar a evaporação, mas retirar um pouco de vinho velho e completar a garrafa com vinho mais novo.

 EUREKA!

Soldati esbugalhou os olhos e quase caiu da cadeira.

 Balbuciou algumas frases e confessou não saber em quem acreditar, se em Venazio Sella ou nos Biondi Santi.

Eu não sou tão diplomático nem tão educado e não acredito em uma só palavra dos grandes e riquíssimos produtores toscanos.... Biondi Santi inclusos, duvido que a “ricolmatura” aconteça de 25 em 25 anos e que seja realizada com o vinho da mesma safra.

Ela pode acontecer quando e como os Biondi Santi bem entenderem e com vinho que eles quiserem.


No escurinho da adega é possível fazer todas as “sacanagens” possíveis e imagináveis sem que ninguém saiba nada.

É possível, até, produzir um vinho de 1955 novinho em folha.

 Basta usar a famosa “Ricolmatura Venanzio Sella”

O resto é folclore é lenda, para poder cobrar, dos enoloides abonados, 9.200 Euros por uma garrafa de Brunello.

Você, que é um enoloide, acredita em todas as picaretagens do mundo do vinho e quase desmaiou ao ver o sarcófago do Jean Claude Cara-de-Pau, compre meia dúzia de garrafas do Romanée-Biondi 1955/1995 e seja feliz. 
 Dionísio


6 comentários:

  1. Nunca havia pensado nessa possibilidade na troca da rolha. Mas faz sentido.
    Salu2,
    Jean

    ResponderExcluir
  2. Não é possibilidade. A Biondi Santi o faz, oficialmente, desde 1927. A pergunta: E por baixo do pano?

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Na verdade, a questão da troca de rolhas pela Biondi Santi eu até conhecia. Só não havia imaginado a possibilidade de que pudesse acontecer alguma truta no procedimento. A gente é surpreendido a cada dia pelas mutretagens, lamentavelmente.
      Salu2

      Excluir
  3. O que seria plausível para um rolha em termos de anos? 10/15 anos?
    Abcs

    ResponderExcluir
  4. O normal são 15-20 anos depois disso a rolha perde, aos poucos, a elasticidade

    ResponderExcluir