Deixando as charmosas, formosas e badaladas Puligny-Montrachet
e Chassagne-Montrachet é quase emocionante percorrer os poucos quilômetros que
separam as duas cidades da pequena Saint Aubin.
O percurso é curto, a estrada movimentada, a paisagem comum, mas
é obrigatório parar algumas vezes para admirar o trabalhos dos vignerons.
Nas vinhas que circundam Gamay, distrito de Saint Aubin, é fácil
perceber a importância do homem no “terroir”: Todos os dias, faça frio, calor,
sol ou chuva, há muitos proprietários cuidando pessoalmente de suas vinhas.
Trabalho duro e quase ininterrupto nos parreirais, heranças
culturais preservadas, profunda identificação com o território.
Os viticultores Côte
D’Or dão a impressão de sentir paixão e quase ciúme de suas terras.
Orgulho então........
Quando um viticultor consegue comprar um pedacinho de Grand ou
Premier Cru, por mínimo que seja (estou falando de 300-400-500 metros quadrados, não
mais), é festa na família.
Não importa se os poucos metros adquiridos estão em outra
aldeia distante, se o aumento da produção será de apenas algumas centenas de
litros, se o trabalho aumentará desproporcionalmente…O que importa é que a Domaine,
que os filhos e netos certamente herdarão, aumentou, por exemplo, em 500 metros
quadrados de vinhas no “Criots-Bâtard-Montrachet”.
É a gloria!
Saindo da vinícola dos Bachelet, escondida e difícil de encontrar, resolvi passear por Saint Aubin.
Em Saint Aubin, como em todas as outras aldeias da região,
tudo e todos transpiram vinho.
Em Saint-Aubin não há outra atividade digna de nota além da vinícola,
mas apesar de transpirar vinho não se encontra um único “Bar a Vin” para se
beber uma taça.
Meia dúzia de ruas silentes e desertas, dezenas de vinícolas
expondo, quase timidamente e sobre velhas barriques suas
garrafas (vazias), janelas e portas cerradas: Saint-Aubin faz velório parecer
baile de carnaval.
Olhares curiosos e desconfiados (a placa do meu carro era italiana…).
Sorrisos?
Nenhum e ninguém faz
força para agradar ou agarrar o turista-comprador.
É a Borgonha......
Havia conseguido adquirir algumas garrafas, de Blachot-Dessus
e Bienvenues-Bâtard-Montrachet, dos Bachelet e caras feias já não me
assustavam: Me sentia comprador e queria
mais.
Ainda bem que meu dia “gastador” se revelou e apareceu na
quase monástica Saint-Aubin....
Já estava procurando um local para manobrar o carro e retornar
a Puligny quando, durante a manobra, quase derrubei uma barrique com sua exposição
de garrafas desbotadas e vazias.
Tremula, mas ainda ereta, uma borguinhona sedutora, com a
etiqueta indicando ter abrigado, no passado, um “Criots-Bâtard-Montrachet”
2006, desafiou minha claudicante carteira.
Parei o carro, consultei meus ralos Euro e entrei.
“Notei que vocês produzem Criots-Bâtard-Montrachet. Há algumas
garrafas à venda?”
A mulher que me atendeu, na sala de degustação da Domaine,
sorriu e, balançando a cabeça afirmativamente, respondeu: “Temos algumas de
2010”.
“Safras mais velhas, alguma coisa?”
O marido, que havia nos alcançado, respondeu: “Posso dispor de
duas garrafas de 2009”.
Sorrisos, algumas piadas, uma rápida degustação de um ótimo
Saint-Aubin da vinícola, despedida fria e profissional.
Três 2010 e dois 2009 de Criots-Bâtard-Montrachet da Domaine Château de
Saint-Aubin foram fazer companhia aos vinhos do Bachelet que já estavam
no carro.
Denis e Alexandra são proprietários de 7 hectares e suas
vinhas se estendem por Saint- Aubin, Meursault, Puligny, Chassagne, Santenay.
A produção anual, da
vinícola, oscila em torno de 40.000 garrafas, mas apenas 280/300 saem de seus
500 m² localizados no Criots-Bâtard-Montrachet.
Sim, a Borgonha é assim: 500 m²e apenas 500 m², são o orgulho
do viticultor Denis e sua mulher Alexandra.
Vender?
Nem pensar!
Comprar mais?
Difícil, quase impossível.
Há vignerons que possuem apenas dois filares (não mais de 200
parreiras) de Montrachet e não vendem nem ao Papa.
Isso se chama: T E R R O I R!
Terroir, não é “terreno”, terroir não é clima, subsolo,
altitude, exposição solar, características geológicas etc.
Terroir, sem os Bachelet, Jambom, Denis, Bzikot, Morey, Raphet,
Colin e milhares de outros vignerons que respeitam, amam e entendem, como minguem,
suas vinhas, não existiria.
Terroir é o homem, também e principalmente.
Sem o homem não há terroir nem vinho, mas o homem não deve nem
pode ser um predador e negociante imediatista sem escrúpulos (qualquer
semelhança com os empresários gaúchos é mera coincidência…)
Assim, como na visão e filosofia de Pierre Antoine Jambom e
milhares de outros vignerons, há algo além de dinheiro nas vinha; há 800 anos
de história que não pode ser comprada por meia dúzia de chineses, brasileiros,
americanos ou russos abonados.
Na próxima semana: Invasão chinesa, brasileira, russa e
degustação dos vinhos mencionados.
Muito bom! Aguardo o Terroir 4.
ResponderExcluirSalu2,
Jean
faço minhas as palavras do Jean. mas mate-nos de inveja, Bacco: quanto saiu cada garrafa de Criots-Bâtard-Montrachet de Domaine Château de Saint-Aubin? já abriu alguma?
ResponderExcluirEduardo , suas perguntas serão respondidas na próxima matéria
ResponderExcluirBoa reportagem. Indicada para os que se odeiam e querem lembrar o tanto que nao tem acesso as boas coisas da vida por precos corretos. Vinho tambem faz parte das boas coisas.
ResponderExcluirPS: Predadores gauchos somente? E a turma de SC, nao entra tambem?
PSII: Cuidado com inveja dos predadores. Muitos devem ate a nona incarnacao e estao insolventes, ainda que nao tiraram o gel do cabelo nem a pose nos eventos que contam com a presenca dos amigos de voces.
Por qual razão os produtores vendem tão poucas garrafas a um comprador/turista?
ResponderExcluirAcho que vc não leu direito.
ResponderExcluirOs viticultores mencionados produzem pouquíssima garrafas que são reservadas , há anos, por fieis clientes. Para conseguir três garrafas de Bienvenues-Bâtard-MOntarchet do Bachelet tive que reservar com seis meses de antecedência.. a Borgonha é assim.
Belo artigo. Um dia ainda vou a Borgonha.
ResponderExcluirContinuem com estes textos otimos, tambem aguardo o proximo!! Abraços, C. Maul
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