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sábado, 1 de fevereiro de 2020

GRAGNANO


Descobrir vinhos obscuros é especialidade de B&B.

Como leitor voraz do site, vi Bacco, Bocca e Dionísio em incontáveis epopeias para achar Loazzolo, Gamba di Pernice, Blanc de Morgex et de la Salle, Rubesco, Picolit, Susumaniello e vários outros vinhos fora do radar do enófilo brasileiro.

 

 Como também os vi defender os bons Lambrusco, Dolcetto, Pinot Bianco e outros que, com a fama e a proliferação, tiveram suas reputações manchadas.
Mas, que coisa: eu mesmo não esperava descobrir um pequeno grande vinho.


Por questões burocráticas familiares, passei alguns meses na Calábria, envolvido com a burocracia italiana.

Com isso, e sem carro, resolvi aproveitar os vinhos do dia-a-dia que os supermercados e enotecas locais ofereciam.

 Da mesma maneira, provar as especialidades locais e desfrutar do estilo de vida local, bem menos acelerado que minha vida quotidiana em Brasília.

Além de ter dado a enésima chance ao Cirò calabrês - vinho que, na melhor das hipóteses, é medíocre -, conheci outros vinhos mundanos: Rosso Conero, Sannio, Locorotondo.

 

 
 Numa de minhas incursões ao supermercado Spar (chamado por minha irmã de Despair, "desespero", em trocadilho jocoso com o nome Despar utilizado em algumas lojas da rede), encontrei um vinho cuja denominação de origem me era completamente estranha: Gragnano.

Sem lembrar se B&B tinha escrito algo sobre o vinho, resolvi pegar uma garrafa, da “Cantine Astroni”.

Ao chegar em casa, descobri que o Gragnano era um vinho da Campânia, frisante, feito com uvas locais da Peninsola Sorrentina e considerado, pelos napolitanos, a companhia perfeita para uma pizza.

Pensei duas coisas:
- primeira, que foi bom não ter percebido que se tratava de um vinho frisante,jamais o compraria;
- segundo, que, se os napolitanos, inventores da pizza, dizem que o Gragnano é o melhor vinho para acompanhar o prato, é porque o vinho é bom.


Dias depois, na primeira oportunidade que tive de assar uma pizza, abri a garrafa.

Que pequeno grande vinho!
A comparação imediata é com os bons Lambrusco, que raramente chegam ao Brasil e já foram merecidamente defendidos por Bacco:

http://baccoebocca-us.blogspot.com/2019/05/lambrusco-i.html

http://baccoebocca-us.blogspot.com/2019/05/lambrusco-2.html

Um vinho frisante, leve, feito com uvas Piedirosso, Aglianico e Sciascinoso, com apenas 11,5% de álcool.

 Impossível não lembrar de um bom Lambrusco.
Entretanto, ao contrário do "primo" da Emília-Romagna, o Gragnano - que é safrado -, segue sendo um segredo bem guardado, cuja produção se concentra ao redor do Monte Lattari e da Península Sorrentina como um todo.

 

Mario Soldati, em seu "Vino al Vino", assim descreveu o Gragnano:"Perfume de vinho e campestre; frisante e inclusive, quando jovem, de uma espuma que caía rápido e, rapidamente, desaparecia para sempre; pastoso e denso, mas, ao mesmo tempo, escorregadio; como um Lambrusco mais encorpado, ou uma barbera menos encorpada (...) apesar da cor, não deve ser bebido à temperatura ambiente, mas àquela de uma geladeira". 

E foi assim que descobri um pequeno grande vinho, capaz de te fazer secar a garrafa sem nem perceber (e te deixar bem alegre, apesar do pequeno teor alcoólico) e que nem de grandes taças necessita.


Como já mencionado, nunca vi um Gragnano chegar ao Brasil, e, mesmo na Itália, não é tão fácil de encontrar.

Se estiver na bota, e especialmente no sul, não há melhor companhia para uma pizza - nem mesmo aquelas coisas da Maremma que seu amigo endinheirado anda ostentando no Instagram.

 

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