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domingo, 16 de fevereiro de 2020

VINHO-MODA-VINHO


O ato de beber vinho, até os anos 1970, era banal, corriqueiro e simples.
Não era considerado glamoroso nem refinado: bebia-se e pronto. 
 

 Não havia modismos, não existiam indicações de sommeliers, críticos, experts, formadores de opinião etc. e não era “obrigatório” encontrar dúzias de recônditos aromas, inúmeros sabores e raras sensações.
 

 Pedia-se um vinho, quase sempre “da casa” e ninguém exigia taças Riedel, Zalto o outro precioso cristal.
 

 Na Itália, dos anos 70, bebia-se, basicamente, vinhos locais e os “importados” não tinham vez.

 É preciso esclarecer que os “importados” eram vinhos produzidos em outras regiões italianas.

 
Exemplo: O piemontês não conhecia e nunca provara um Nero D’Avola, o toscano nunca molhara a boca com um Taurasi, o sardo nunca ouvira falar do Sagrantino di Montefalco, o veneziano   nem desconfiava que existia o Primitivo di Manduria e....... por aí vai.

Havia poucas e raras exceções que “ousavam” ultrapassavam as fronteiras, entre elas e mais famosas, o Lambrusco e o Chianti.

Não posso afirmar exatamente quando tudo mudou e o vinho encontrou e resolveu enveredar o caminho da “moda”, mas arriscaria uma data provável:  início dos anos 1980.

Os responsáveis, pela mudança do comportamento, foram o boom econômico europeu e Robert Parker.

Parker, grande farejador e oportunista, percebeu que vinho era um campo quase virgem, emergente e promissor.

 Sem pensar muito, no final dos anos 1970, mandou sua carreira de advogado às favas e, já em meados dos anos 1980, com suas degustações pontuadas, norteava os gostos e preferencias de um sem número de seguidores.

Começava a “Moda Parker” dos vinhos alcoólicos, impenetráveis, amadeirados, superconcentrados (marmelada) etc. feitos sob medida para a alegria de milhões de enoloides.

Além da sedução, dos “pontos parkerianos”, era preciso promover e endeusar uma figura até então desconhecida: O enólogo!

Os enólogos, durante algumas décadas, foram endeusados e reverenciados como se fossem stars hollywoodianas.

 
O “enólogo-star” e símbolo máximo, da era “Parker, ” foi o Michel Rolland.

Rollando Lero, com seus vinhos todos estandardizado, excesso de madeira, bombas frutadas e uma boa dose de química, conseguiu, através de centenas de consultorias, espalhadas pelo mundo (até no Brasil), impor o modelo “Parker” como o padrão a ser seguido.

Nascia o vinho “internacional”

A importância e admiração dedicada ao “enólogo-pop-star”, no Brasil, chegou a ser ridícula: apertar a mão do Michel Rolland, ou outro winemaker qualquer, era a glória dos diretores da ABS e provocava orgasmos nos críticos, enófilos, sommeliers, formadores de opinião etc.


Cavalgando a onda parkeriana o vinho virou grife e a cada ponto (acima dos 90), concedido pelo ex advogado, provocava uma frenética busca das etiquetas incensadas e consequentemente uma verdadeira corrida para remarcar os preços.

 Chegamos, assim, à moda da imbecilidade total: Vinhos de grife, de alta moda, custando U$ 500-1.000-3.000 e se mais enoloide houvera, lá chegara......

Os pontos parkerianos, há alguns anos, já no fazem muito sucessos, os vinhos “internacionais” cansaram os consumidores, os enólogos já não são tão endeusados e o brilho de sua presença já não ofusca as mentes …perderam o charme inicial.

 
Estava aberto o caminho para o aparecimento de uma nova moda, a moda dos “Vinhos com grande identidade territorial”

Quem havia investido nos “internacionais” fez rapidamente o ”meia-volta-volver” e tudo voltou para os anos 1970.

Quem havia apostado em vender Barbera e Dolcetto com 15° de álcool e por preço de Barolo, perdeu a aposta e seus vinhos mofam nas prateleiras.

Exemplo: As Barbera “Pomorosso” da Coppo, “Spinetta” da vinícola homônima (Euros 45) e a magnum “Pozzo dell’Annunziata” de Roberto Voerzio (Euros 280) aguardam nas empoeiradas prateleiras os sempre mais raros e ralos turistas enoloides.


O mercado inquieto, como sempre, precisava encontrar uma nova motivação, uma nova moda para manter aceso desejo do novo, do consumo.

Não foi difícil e quase ao mesmo tempo surgiram os vinhos, biológicos, biodinâmicos e naturais.

Três novidades, três picaretagens.

Produzir vinhos biológicos na Europa é praticamente impossível.

Exemplo: Há, na Itália, 310.428 empresas vinícolas que dividem os atuais 652.000 hectares de vinhedos. Um pequeno exercício matemático nos leva à média de pouco mais 2 hectares para cada produtor.

Há alguns “grandes” proprietários com 20-50-150 hectares, mas a média continua sendo de 2 hectares.

Na França (media 6 hectares), Espanha (3 hectares) e em Portugal, o panorama pouco muda.

Aí faço uma pergunta: Como pode um viticultor produzir biologicamente se o vizinho, 3 metros além de sua “cerca”, usa e abusa do glifosato?

Como pode o José, etiquetar seu vinho como sendo “biológico” se seu vizinho, João, insiste em pulverizar suas vinhas, sei lá com qual produto químico e o vento leva a nuvem branca sobre seu vinhedo?

Veja as fotos que tirei em Puligny-Montrachet e tire suas conclusões.
 

A moda continua...

Bacco   
 

 

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