Em minha última matéria abordei o
declínio dos grandes “papas” do vinho que comandaram as tendências, gostos e
desgostos, dos enófilos, por mais de duas gerações.
Devo informar que os Parker &
Cia não influenciaram somente o consumidor, mas revolucionaram todo o sistema
produtivo, também.
A maior parte das engarrafadoras
italiana produzia vinho com as uvas fornecidas por pequenos viticultores.
Durante muitos anos o sistema
funcionou normalmente sem grandes mudanças.
Com o passar dos anos os
viticultores perceberam que os vinhos, produzidos com suas uvas, eram vendidos,
pelas engarrafadoras, por preços altamente lucrativos e os donos das grandes
vinícolas a cada dia se tornavam mais ricos e não se preocupavam em esconder
suas vaidades, frequentando programas televisivos, restaurantes estrelados ao
lado de belas mulheres e desfilar com SUV de alta cilindrada.
Os pequenos vinhateiros pararam para e pensar
e... “Espera, aí....se deixar de vender as uvas e eu mesmo
vinificar e engarrafar posso ganhar muito mais”.
Em poucas e simples palavras foi
o que exatamente aconteceu, assim, milhares de viticultores deixaram de vender seus cachos e começaram a produzir suas garrafas.
Exemplos 1: Bruno
Giacosa não possuía uma vinha
sequer e seu famoso “Barolo Vigna Rionda” nascia de uvas fornecidas pelo viticultor Tommaso Canale.
Canale, que possuía 1,64 hectares
de vinhas, no famoso cru de Serralunga D’Alba, foi acompanhando a evolução dos
preços de Giacosa e um belo dia decidiu que era chegada a hora de deixar de vender
suas uvas e começar a produzir o seu “Barolo Canale Vigna
Rionda”.
Tommaso Canale foi um dos
milhares de viticultores que tomaram a decisão de vinificr em próprio e entraram
no mercado com suas etiquetas.
Exemplo 2: A Nicola Bergaglio não vendia suas
uvas Cortese, mas
entregava seu vinho, já engarrafado, à famosa vinícola “La
Scolca” que somente tinha o
trabalho de etiquetar e vender o “Gavi dei Gavi
Etichetta Nera” por 400% a mais.
Alguém acredita que os predadores
sentiram o golpe, se apavoraram e decidiram pagar mais pela matéria prima aos
pequenos viticultores?
Quem acreditou, errou e errou
feio.
As vinícolas estavam com os
cofres tão abarrotados que não tiveram nenhum problema em sair às compras
(Giacosa, incluso) e arrematar tudo o que podiam e queriam.
Resultado:
Em 1990 havia, na Itália, 791.000 empresas vinícolas em 2023 o número baixou
para “apenas” 255.000.
Outro dado importante: em 1990 tamanho
médio das propriedades era de 0,9 hectares hoje é 2,5 hectares.
Quem resistiu, não vendeu e se
estruturou, ganhou muita grana.
Exemplo: Em
1990 um hectare de vinhas de “Brunello di Montalcino”, valia 40 milhões de
Liras que correspondem aos atuais 36.550 Euros.
Hoje quem quiser comprar o mesmo hectare,
em Montalcino, deverá desembolsar 750.000 Euros.
Mas o mundo gira, gira, gira
e.....agora há mais uma crise no setor que atinge, fortemente, os vinhos tintos.
O alerta começou nos Estados
Unidos onde, em 2023, as vendas dos tintos diminuíram em 9%.
Os mais atingidos foram os vinhos
produzidos com Cabernet Sauvignon -7%, Merlot –12% e o Syrah -17%.
Na Itália, também, os vinhos
tintos perdem terreno e a grande distribuição (supermercados, atacadistas,
distribuidores etc.) diminui em 800.000 hectolitros suas compras de Barolo,
Amarone, Chianti, Brunello, di Montalcino, Montepulciano, Primitivo, Nero
D’Avola etc.
Os produtores mandam, de uma vez
por todas, os vinhos parkerianos para a lixão da história vinícola e apostam em
garrafas com menos álcool, leves e com forte identidade territorial.
Para completar o quadro de
declínio: muitos países produtores, entre eles, USA, Chile, Argentina, Austrália, África
do Sul, estão erradicando os vinhedos de Cabernet Sauvignon, Merlot e Cia
substituindo-os por Chardonnay e Sauvignon Blanc.
No Brasil dos trópicos e dos 35º de temperatura, os grandes entendedores de vinho, continuam bebendo Amarone, Barolo, Nero d’Avola, Malbec e quanto mais alcoólicos melhor.
Para encerrar, não poderia deixar
de parabenizar à vinícola Lídio Carraro que, com seu apurado faro de grande
predador, lançou o “Vinum Amphorae” um blend de Merlot, Pinot Noir,
Nebbiolo e Malbec.
Não sei se o “Vinum Amphorae” vem com um folheto explicativo escrito em latim, como na
etiqueta, mas sei que seus 15,5º de álcool e
seus R$ 657,90 de custo,
comprovam que a Carraro é o palhaço mais ridículo do circo vinícola brasileiro
Parabéns!
Dionísio