Já não lembro quantas vezes visitei a Borgonha vinícola nos
últimos 20 anos.
Quinze, vinte, trinta?
Minha memória, para números, datas etc. é proverbialmente
ridícula
Para piorar, jamais me preocupei em anotar quando e por quanto
tempo, percorri as estradas das famosas vinhas dos grandes vinhos da Borgonha.
Posso, todavia, afirmar que foram muitas e que Chablis, Côte D’Or,
Côte Chalonnaise, Mâconnais, Beaujolais não tem grandes segredos
para mim.
A paixão pelos grandes brancos e tintos da Borgonha, muitas
vezes, me fizeram esquecer o “juramento” de limitar o valor das minhas compras
e jamais ultrapassar o teto de 80/100 Euros.
Um Montrachet aqui, um Criots Bâtard Montrachet ali, um
Charmes Chambertin acolá e.... a cada visita minhas promessas eram solenemente
esquecidas, abandonadas, mas eu me absolvia, dos pecados vinícolas, prometendo
que aquela seria a última vez (foram dezenas de “última vez”)
Um belo (mau?) dia chegaram os turistas russos e mais tarde os
chineses, sempre cheios de dinheiro e vazios de cultura vinícola, mas sedentos
de etiquetas raras e caras.
Resultado? Os preços dispararam quase alcançando os $$$$$$$
dos produtores-predadores nacionais.
Os novos “eno-abobados-abonados” fizeram a alegrias dos
“vignerons”, mas provocaram terríveis pesadelos aos enófilos que, antes dos
sedentos sino-russa, conseguiam sonhar e comprar, por preços quase humanos, as ótimas
garrafas da Côte D’Or.
Com magros $$ nos bolsos,
transferi minhas atenções etílicas para as garrafas da Côte Chalonnaise onde ainda
é possível beber bons Mercurey, Givry, Rully gastando 15/30 Euros.
Voltei com prazer às vinhas do Macôn onde pude saborear ótimos
Saint-Véran,
Pouilly-Vinzelle, Pouilly-Fuissé, Virè-Clessé por 12/28 Euros e
dedico sempre maior atenção aos vinhos de Chablis onde, garimpando, com
cuidado, encontro surpreendentes garrafas custando 15/30 Euros.
12,00 €
Com o Euro flanando acima dos R$ 6 e piscando, sedutor, para
R$ 7, voltei, sem mais delongas, aos velhos tempos e estabeleci que 50 Euros seriam
o teto máximo de minhas loucuras etílicas.
Adieu, Puligny-Montrachet, Chassagne-Montrachet, Meursault,
Gevrey-Chambertin, Aloxe-Corton, Vougeot, Chambolle-Musigny....
Sem grandes esperanças de retornar às vinhas de Chassagne-Montrachet,
no final de semana, para recordar os bons tempos e impressionar três convivas, resolvi
abrir uma garrafa de “Les Dents De
Chien” 2013 adquirida, por 40
Euros, diretamente, de Thomas Morey, em Chassagne.
Desarrolhei o vinho,mas quando vi a cor do “Les Dents De
Chien”, acusei um tremendo chute no fígado (minha proverbial educação freia o
desejo de dizer onde fui realmente atingido.... )
O “Les Dents de Chien” 2013,
já estava a caminho do necrotério onde seria, “mortinho-da-silva”, embalsamado
e sepultado.
A "velha-prostituta-das-garrafas-perdidas", que dorme em um
recôndito canto de minha mente, lembrou de antigas experiências, assim, resolvi
“ressuscitar” o “Les Dents de Chien” com a quase esquecida técnica.... “Botox-Vinícola”
Despejei em uma taça
(veja foto) quatro dedos do vinho “moribundo” em seguida completeis a garrafa
com a mesma quantidade de um vinho mais novo.
O vinho escolhido, para realizar o “Eno-Botox”, foi um Chardonnay
“Ventisquero”.2022 que eu
estava bebericado enquanto cozinhava.
O resultado?
O “Les Dents de Chien Botox” foi elogiado e apreciado por todos os
convivas.....eu incluso
Alguns puristas, ao ler a matéria, torcerão o nariz, mas
melhor um vinho “Botox” na taça do que uma garrafa de “Les Dents de Chien” na pia
Continua na próxima matéria
Bacco
PS. Derramei a taça de vinho, que retirara do “Les Dents de
Chien, na garrafa do “Ventisquero”
Resultado? O melhor
Chardonnay do Cone Sul.