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quinta-feira, 8 de dezembro de 2022

I TRE VESCOVI

 


Prometi uma matéria sobre o ótimo Barbera “I Tre Vescovi” (Três Bispos) de Vinchio e Vaglio Serra.

Se os leitores perguntarem para 99,99% dos nossos críticos vinícolas, sommeliers, enófilos, jornalistas do ramo etc., sem que eles possam acessar o Google, além de não saber responder não saberão nem pronunciar corretamente Vinchio e Vaglio Serra (Vínkio e Válhio Serra)



Vinchio e Vaglio Serra, duas aldeias da província de Asti, apesar de quase desconhecidas pela maioria dos enófilos, dão vida a um dos melhores Barbera da Itália e consequentemente do planeta.

Vinchio e Vaglio Serra, perdidas nas colinas do Monferrato e circundadas por um mar de vinhas, abrigam, juntas, menos de 1.000 habitantes que, em sua quase totalidade, se dedicam à viticultura.

O Barbera “I Tre Vescovi” é produzido pela “Cooperativa dei Viticoltori Associati di Vinchio e Vaglio Serra”.



A cooperativa nasce em 1959, quando 19 viticultores, esquecendo as tradicionais rivalidades entre as duas aldeias, se uniram.

Melhoraram os vinhedos, selecionaram clones, adotaram técnicas mais modernas de vinificação, mas conservaram a tradição e algumas velhas vinhas que sempre haviam produzido as melhores uvas.

 Em 1960 a cooperativa iniciava a produção de seu grande Barbera.

Hoje, a Cooperativa Vinchio e Vaglio Serra, conta com 192 associados, quase 500 hectares de vinhedos, sendo que 75% são reservados às vinhas de Barbera.



“Descobri” o Barbera “I Tre Vescovi” nos anos 1990 quando um amigo jornalista, durante um almoço, em Canelli, ordenou uma garrafa.

Eram os anos do ressurgimento dos vinhos piemonteses que, “despertando” de um longo letargo, começavam a rivalizar com o domínio absoluto dos toscanos Chianti Brunello e cia....



Eram, também, os anos do Barolo, dos “Barolo Boys” e suas garrafas “parkerianas” mais próximas às marmeladas de frutas, sabor madeira e baunilha, do que ao verdadeiro Barolo.

Todos queriam navegar na onda de Parker e suas preferências para conquistar o mercado internacional, faturar alto, mesmo que as “concessões” significassem a desnaturação dos vinhos.



Lembro que, “vítima” da intensa propaganda, certa vez, também, saí à procura de um Barbera da “Spinetta” que ganhara todos os elogios, prêmios em inúmeras degustações, citações favoráveis e entusiastas de guias, entre elas “3 Bicchieri”, “Slow Wine” etc.

Quando o amigo jornalista ordenou o “I Tre Vescovi” comentei minha frenética corrida para encontrar e comprar a Barbera da “Spinetta”.



O amigo ouviu o meu relato e ao final suspirou e..... “Mais um bebedor de etiquetas...... Prove esta Barbera que custa menos da metade e é muito melhor”.

Após o primeiro gole.... morria, ali e então, a crença nos “profetas” do vinho e nascia a independência do meu paladar.



Continua

Bacco

PS. A pronúncia correta: Tre Véscovi

quinta-feira, 1 de dezembro de 2022

CAMPO LIGURE II

 

Acredito que a mais importante atração de Campo Ligure seja o “Museu da Filigrana”.

A filigrana é uma antiguíssima técnica de ourivesaria, difundida no mundo todo, mas com características próprias de cada escola.

Na Itália, a filigrana, já estava presente entre os etruscos e também na Roma imperial onde se produziram as primeiras joias obtidas exclusivamente em filigrana.

Uma visita é obrigatória e se as joias enfeitiçarem os olhos, e coçarem os bolsos, recomendo um endereço: “Filigranart”.



Impossível visitar todas as igrejas da Itália (há quase 65.000), mas há as que merecem uma parada.

Das 6 igrejas, de Campo Ligure, uma merece particular atenção: “Oratorio N.S Assunta”.



Bem aos pês da escadaria que leva ao castelo, o “Oratorio N.S. Assunta” não atrai a atenção do turista que, ao ver sua “pobre” fachada, não pode imaginar que a pequena igreja guarda algumas obras de arte de rara beleza e valor.

Já ao entrar no “Oratorio” um enorme e belíssimo crucifixo, prateado e dourado, chama a tenção.



Estes preciosos crucifixos, na Itália, abrem as procissões mais importantes.

O interessante é que estas cruzes, durante todo o percurso da manifestação, são carregadas por vigorosos fieis que a cada 50-100 metros (mais seria impossível, pois o peso dos crucifixos supera os 100/130 kg) as repassam a um colega descansado



À direita, um belo conjunto de escultura em madeira representa a lapidação de Santo Estevão.




A mais impressionante obra de arte está um pouco mais adiante: Uma incrível escultura, em madeira, que representa o Cristo crucificado.

O interior da igreja é de deixar boquiaberto até o mais exigente turista.



Após do elevar o espírito é chegada a hora satisfazer o corpo, sentidos, paladar, estomago......

Depois de um calmo e relaxante passeio pela aldeia, percorrendo suas calmas ruelas medievais, desembocamos na praça principal bem na hora do aperitivo do meio dia.

Na esquina da praça, um endereço imperdível: “Bar Moderno”.

Incrível!

Em uma aldeia de 3.000 habitantes, perdida no meio dos Apeninos lígures, o bar bonito, elegante, acolhedor e com uma carta de vinhos de fazer cair o queixo, é a melhor escolha.



O “Bar Moderno” é o exemplo clássico da importância que se dá ao vinho na cultura italiana.

No “Bar Moderno” dezenas de etiquetas de tintos, brancos, rosés, espumantes, podem ser degustadas em taças

Difícil é decidir entre Barolo, Barbaresco, Brunello, Barbera, Gavi, Franciacorta, Alta Langa, Amarone, etc. etc.

Giorgia, proprietária e competente sommelier, com simpatia e profissionalismo chega para ajudar e..... “Dia frio, nublado, triste...Para alegrar recomendo um belo Barbera D’Asti da vinícola Scarpa”.



Sugestão perfeita e acatada com entusiasmo.

Uma taça da ótima Barbera, do tradicional produtor de Nizza Monferrato e um pratinho de tira-gostos (salame, presunto, queijo grissini) me aliviaram em 3,5 Euros.

A qualidade da Barbera Scarpa, o ambiente e o preço me “obrigaram” a repetir a dose.



Enquanto bebericava a segunda taça de Barbera e me divertia com as conversas dos clientes, peguei o celular e resolvi fazer algumas contas: Com seu salário mínimo (1.500 Euros), um trabalhador de Campo Ligure poderia beber, se conseguisse, 428 taças de Barbera Scarpa por mês.

O José Souza, bravo trabalhados e morador de Ceilândia (DF), com seus R$ 1.212, poderia beber, no máximo 81 taças da deplorável Barbera Perini.



Qual o cálculo?

Uma garrafa da quase-Barbera Perini custa R$ 70.

Cada garrafa equivale a seis taças.

Cada taça custa, para o dono do bar R$ 11,60

Para obter algum lucro o comerciante precisa vender, no mínimo, uma taça, da deplorável Barbera Perini por R$ 18.

Resultado: Se o paladar do José Souza for de epóxi ou engolidor de fogo, ele conseguirá beber 67 taças por mês.



 Utilizando os mesmos cálculos, aplicados ao quase-Barbera-Perini, o José Souza, com seu salário poderá entornar apenas e ainda bem, 25 taças “ Pireneus Bandeiras Barbera”.

Escrevi “apenas e ainda bem” por duas razoes:

 1ª- o “Pireneus Bandeiras Barbera” é um insulto à casta piemontesa.

 2ª – Barbera goiana com 16º é um insulto à inteligência de qualquer enófilo com mais de 4 neurônios.

Analisando os cálculos acima dá para perceber quando o Brasil será um importante mercado vinícola?

Hora de almoço pedi informação e Giorgia indicou um restaurante na mesma rua: “Vigos 2.0”.

Local simples, comida boa e preço mais que honesto.



Flan de espinafre com fondue, peito de peru recheado ao forno com ervilhas, ½ garrafa de Barbera “I Tre Vescovi” (Três Bispos) = Euro 20.



Campo Ligure, bela e cativante aldeia.... Não perca.

Na próxima matéria escreverei sobre a Barbera “I Tre Vescovi” de Vinchio e Vaglio Serra.

Bacco

 

 

 

 

 

 

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quinta-feira, 24 de novembro de 2022

CAMPO LIGURE

 


Admito que já há alguns anos raramente e sem entusiasmo, visito as capitais do turismo europeu.

Já perdi a conta de quantas vezes fui a Barcelona, Madri, Lisboa, Paris, Roma, Veneza, Firenze, Londres, Viena, Budapest, etc. e hoje não é difícil perceber que todas sucumbiram ao turismo de massa-pit-stop, praticado por turistas “manadas”, apressados, hora marcada, ávidos para ver tudo e todos no menor espaço de tempo possível e imaginável.


 Um pulo na igreja (há milhares), outro na praça principal, mais um em um museu, uma coca, uma pizza, filas nas portas de banheiros (principalmente as mulheres) 150 “selfies” e....Lá vamos nós para a próxima cidade.

Se o “turismo manada” ainda é suportável, difícil é conviver com os milhares de imigrantes que literalmente invadiram as zonas centrais das principais cidades europeias e as transformaram em pontos de vendas de drogas, de assaltos, roubos, banheiros, dormitórios etc.



Fugir da violência do Rio (exemplo) e encontrá-la, mesmo em menor escala, em Roma (outro exemplo) não dá.....

Solução?

Pequenas aldeias e médias cidades.

Já escrevi várias matérias sobre o assunto e termino esta introdução declarando que prefiro passar uma semana passeando por Pienza, San Quirico d’Orcia, Montepulciano, Montichiello, Castiglione, d’Orcia, Montalcino, Castelnuovo dell’Abate etc. do que um dia em Milão, Paris, Roma ....


Prefiro a sedutora e misteriosa magia medieval das aldeias italianas (há centenas) do que quase opaco brilho das metas “obrigatórias” do turismo europeu.

Vamos ao que interessa......Campo Ligure.



Não sei quantas vezes, percorrendo a autoestrada “A7”, para alcançar Santa Margherita, uma pequena aldeia e seu castelo chamaram minha atenção.

Também não sei quantas vezes prometi, a mim mesmo, visitá-la sem nunca manter a promessa...

Dia frio, nublado, triste....







Santa Margherita, para quem não sabe, nos meses outonais revela a mesma alegria de um cemitério em final de tarde chuvosa.

Lojas, hotéis, bares, restaurantes, quase todas fechados, raríssimos turistas; Santa Margherita parece hibernar.

Pensei em algumas opções não muito distantes e .... Campo Ligure.

Campo Ligure, pouco mais de 60 km, distante de minha casa foi a escolha mais acertada dos últimos meses.



Meia dúzia de ruas, pouco menos de 3.000 habitantes, 6 igrejas, 1 castelo, 2 praças, 2 museus, 1 ponte medieval, meia dúzia de bares, 2 restaurantes e....charme para todos os gostos.



Campo Ligure, apesar de milenar, não revela o costumeiro e arredondado traçado medieval e, salvo algumas muito estreitas (pouco mais de 1 metro de largura), suas ruas são retas e facilmente transitáveis.



Como sempre, no centro histórico, o trânsito de veículos somente é permitido por algumas horas e esta medida doa maior charme e tranquilidade a Campo Ligure.

Bem na entrada da cidade uma igreja e uma fonte.



 Poucos metros, à direita da fonte, há um estacionamento de fácil acesso e, coisa rara nas aldeias italianas, gratuito.

Carro estacionado, casaco de frio, cachecol …lá fui eu.

Primeira etapa, o castelo.

Sugiro visitar primeiramente o castelo, pois a subida exige um bom preparo e muito fôlego para enfrentar a longa escadaria.



Quase todo em ruina, o quase milenar castelo merece ser visitado pela importância histórica, pela bela vista da cidade e dos campos que a cercam, mas é na encosta da colina, onde foi construído, que o turista encontrará a mais incrível e importante atração de Campo Ligure: “Il Giardino di Tugnin” (O Jardim de Toninho).



O “Giardino” é na verdade um impressionante museu a céu aberto onde estão expostas várias esculturas em madeira do artista local Gianfranco Timossi.



Timossi realiza suas obras gigantescas, utilizando, especialmente, troncos e pês de oliveiras, oliveiras que abundam na região.



As fotos anexas dão uma pequena amostra do que pode ser encontrado nas encostas do castelo.



Continua

Bacco

sexta-feira, 18 de novembro de 2022

MAIS UM GIGANTE

 

Nasce mais um gigante no mundo do vinho e confirma a atual tendência do lento, mas inexorável desaparecimento dos pequenos produtores europeus.

Comprar todas as pequenas propriedades parece ser missão quase impossível, a curto e médio prazo, mas os contínuos “assaltos” preocupam os enófilos que, assim como eu, fogem das grandes e caras “griffes”.



Na Itália são inúmeras as vinícolas de peso que saíram do controle familiar para cair nas mãos de grandes grupos: Vietti, Borgogno, Biondi e Santi, Ruffino, Gancia, Isole e Olena, Vigne di Zamò, Sella & Mosca, são apenas algumas delas (seria impossível elencar todas) e é sempre maior o interesse de grandes grupos pelas vinhas mais prestigiosas em todo canto do planeta.

Confirmando, a minha preocupação, informo que, há pouco meses, a aliança entre as famílias Pinault e Henriot deu vida a um novo e colossal grupo no segmento de vinhos de importantes e renomadas etiquetas.



A Pinault é proprietária, desde 1993, entre outras coisinhas, do celebérrimo “Château Latour”.

A mesma Pinault, também, colecionas joias raras tais como “Château Grillet”, “Domaine d’Eugénie” e o “Clos de Tart”.

Para dar uma ideia, da “força” da Pinault, informo que a empresa adquiriu, em 2017, os 7,53 hectares do “Clos de Tart” pela mixaria de 240 milhões de Euros (quase R$ 1,3 bilhão)



Uma rápida conta nos confirma que cada hectare custou a bagatela de 32 milhões de Euros (R$ 170 milhões de Reais).

É bom lembrar que a Pinault comanda, também, griffes famosas como Gucci, Saint-Laurent, Bottega Veneta, Balenciaga, Bucheron etc.

A família Henriot entra no grupo com modestos 100 hectares na Champagne , onde produz o renomado “Champagne Henriot”, com os 78 hectares, em Chablis, da “Domaine William Fèvres”,  “Bouchard Père & Fils” e seus 130 hectares de invejáveis e renomados 1ers Cru  e Grand Crus da Borgonha:  Montrachet, Chevalier-Montrachet, Meursault, Volnay, Pommard, Beaune Clos Saint-Landry, Beaune Clos de la Mousse, Beaune Vigne de l’Enfant Jésus, Corton, Corton-Charlemagne, Bonnes-Mares, Clos de Vougeot, Chambertin, etc.



Quando colossos ,como os dois acima, se unem, percebo que preciso renovar meus estoques de KY.

Agora, um pequeno raciocínio para os que gostam de matemática.

Exemplo 1: Uma garrafa de “Clos de Tart Grand Cru Monopole” custa, em média, 800 Euros e 1 hectare, do homônimo vinhedo, como vimos, foi adquirido por 32 milhões de Euro.

Para “pagar” este 1 hectare a vinícola precisaria, então, vender 40.000 garrafas.



Exemplo2: Um hectare de vinhedos, dos mais caros, na Serra Gaúcha, custa R$ 500 mil.

Uma garrafa de “Lote 43” é vendida, pela Miolo, por R$ 258, assim a Miolo, precisaria vender 1.938 unidades para pagar 1 hectare do “Lote 43”

Vamos supor que o Lote 43, pelo que representa para a família Miolo, pela luta do imigrante Giuseppe e sua enxada, por todas as gotas de suor e lágrimas derramadas (parece samba canção do Lupicínio…), além de outras piedosas e melosas lembranças, valha o dobro, ou seja, R$ 1 milhão?



Menos de 4 mil unidades, do quase vinho “Lote 43”, seriam mais que suficientes para comprar 1 hectares do homônimo vinhedo e deixar os Miolo morrendo de rir de nossa cara enquanto esvaziam nossos bolsos.

Os idiotas franceses precisam vender 40.000 garrafas para comprar seu hectare na Côte de Nuits.

 Nos brasileiros, muito mais espertos, entregamos apenas 4.000 para adquirir a mesma superfície no mítico, fantástico, insuperável, divino, mágico (ufa) “Lote 43”.



Quem não entendeu o “sutil” recado precisa parar urgentemente de beber “Lote 43”......o quase vinho, da predadora Miolo, já afetou, irremediavelmente, seus neurônios.



Perceberam o porquê do meu bordão …. ”A vida do enófilo brasileiro é uma merda”?

Dionísio