Facebook


Pesquisar no blog

quinta-feira, 28 de agosto de 2025

VOU PARA A PATAGÔNIA

 


Escrever sobre vinho, turismo, gastronomia, no Brasil dos nossos dias, soa quixotesco, constrangedor, inútil, razão pela qual ao iniciar esta matéria, me vi como o sujeito entrando em um velório, rindo, bebendo Champagne e cantando “Parabéns Pra Você”.



Minhas matérias não podem interessar e muito menos “concorrer” com prisões, tornozeleiras, brigas, perseguições, tarifaços, lei Magnitsky, e o escambau, que todos os dias, como um tsunami, invadem canais de rádio, televisão, revistas, jornais, redes sociais etc.

Apesar dos tempos recomendarem muita cautela e muito “patriotismo(vinho incluso?), o “vício” venceu a razão e aqui vai mais uma matéria, não sobre a Patagônia, como sugere o cabeçalho, mas algumas opiniões e comparações entre os vinhos chilenos, nacionais e europeus (especialmente os franceses).



 A lembrança, da remota região chilena, apareceu em um final da tarde, quando, um amigo e eu, secávamos uma garrafa de vinho (a segunda)

Taça vai, taça vem....A língua ficou mais solta, as falas aumentaram de volume, as risadas mais estridentes e alguns desejos, mesmo, os mais improváveis e absurdos, vieram à tona.



 Depois das abundantes taças de vinho, nossa insatisfação, com o atual panorama mundial, aflorou e explodiu em incontáveis imprecações contra metade da população mundial.

Neste momento, com a mão livre (a outra parecia colada à taça com Super Bonder …)  Segurei o braço do companheiro de libações e com voz pastosa, grave, pomposa, exclamei: Fosse, eu, algumas décadas mais jovem, não pensaria nem mais um minuto para largar tudo, partir para a Patagônia e morar no Parque Nacional Torres del Paine, sem televisão, telefone, computador, redes sociais e o @a#*X¢, na companhia apenas de ovelhas, guanacos, condores, raposas, pumas e.......100 caixas de vinho chileno”.




O amigo agarrou a garrafa quase vazia do Grand Cru Cassè – Malartic Lagraviere, que estravamos bebendo, derramou o que restava em sua taça e indagou: “Por que 600 garrafas de vinho chileno?



“O vinho chileno é bom, barato e não gastaria uma fortuna para enxugar 600 “patagônicas” garrafas.... Assim, sem estuprar meu cartão, acredito que, já na 564ª ampola, enxergaria um mundo melhor...... ou não enxergaria mais nada”

Uma oportuna pausa nas libações e alguns copos de água com gás, depois, me convenceram que o melhor seria esquecer, por enquanto, o Parque Nacional Torres de Paine e planejar, urgentemente, meu regresso a Santa Margherita Ligure.....





Mesmo quando me vi livrei dos vapores alcoólicos e da Patagônia, minha opinião sobre a qualidade/preço dos vinhos chilenos não mudou um milímetro e enquanto escrevo a presente matéria estou bebericando, prazerosamente, um bom Chardonnay “Don Luis” 2023, da Cousiño Macul, pelo qual paguei razoáveis R$56,60.



É sempre bom lembrar que o deplorável “Miolo Reserva Chardonnay” custa R$ 70 e se comparado ao “Dom Luis” pode provocar uma terrível crise de riso.



A presente matéria continuará. Na segunda parte comentarei alguns os vinhos chilenos, cujo custo/qualidade considero muito interessante e que podem competir, ou superiores, até, a muitos Chardonnay da Borgonha que emporcalham as prateleiras dos supermercados, denegrindo a reputação da famosa região vinícola francesa

Bacco

quarta-feira, 13 de agosto de 2025

LISBOA.....SEMPRE LISBOA

 


Demorou, mas a atual geração de humanos descobriu um local que têm muita história, cultura, gastronomia de alto nível, pessoas do mundo todo, clima razoavelmente suportável (alguns meses no verão no nível inferno, o restante do ano, ameno) — e tudo muito barato.



Durante a Segunda Guerra Mundial, era um hub de muitos espiões, artistas, nobreza do mundo todo.

Esquecido após a segunda guerra, a gravidade da qualidade do lugar acabou atraindo uma multidão para lá desde os anos 2000.

Não falo de Rio Branco, Acre, mas de Lisboa.

 Na segunda passagem pela cidade, com mais tempo e alguns euros sobrando, pude desfrutar bem mais dela.

Segue um curto roteiro de restaurantes, pois, devido ao número de lugares fantásticos, não há como percorrer todos em 100 anos.



Dica que li neste blog e em outros locais de bom gosto: “Marisqueira/Cervejaria Ramiro”.

Lugar sem pretensão alguma de ser upscale, que conta quase sempre com filas constantes, mas uma boa reserva com antecedência ajuda.



Os pratos locais são frescos, espetaculares e nem tão caros.

 Com bebida e sobremesa, duas pessoas gastam uns 50 euros.

Voltei uma vez.



“Time Out Market” continua mandando bem para turistas.

 Se está como turista, faça como o turista.

 O mercado vale uma visitinha, mas chegue antes do gado faminto por fotos e por petiscos.



“Cova Funda” foi uma dica de um guia local. No Intendente. Voltei uma vez.

Bacalhau à lagareiro, polvo grelhado… tudo espetacular.

 Lugar bem simples, sem frescura, atendimento muito bom e preço ótimo.

Falando em atendimento, parece que todo lugar onde moro tem gente com ódio no coração para atender enquanto em todos os restaurantes lisboetas fui extremamente bem atendido.



“Zé da Mouraria”. Sensacional, barato… e muito concorrido.

Muita gente que sai do Castelo de S. Jorge desce ali.

Se quiser ficar fora, espere 5 horas por uma mesa.

Se comer lá dentro, espere até 5 horas para morrer no calor.

Ar-condicionado? Só no pensamento.

Para quem vai em direção a Belém para uma andada pelo mosteiro ou na igreja, ou até mesmo no Museu dos Coches, ali por perto eu recomendo “O Prado”



 Mais um lugar sem frescura, com comida autêntica, local e barata.

Vi o dono rebolar para acomodar algumas pessoas que chegaram sem mesa disponível.

Tinham crianças a tiracolo e eu quebrei o galho do gajo que depois veio me agradecer.

Perguntei por que tinha feito aquilo, se turistas na região não faltam e ele poderia passar muito bem sem eles.

A resposta?

Jamais ouvi algo similar: “Eu não poderia permitir que essas pessoas fossem para outros lugares comer comida ruim e cara”



Esse tipo de coisa renova minha fé (já abalada) na humanidade.

Por último, um restaurante que ficará marcado na memória para sempre — ou até que a chegada da demência:

Belcanto.





Atendimento, comida, local, “experiência”... tudo à altura de um Michelin com 2 estrelas (artigo sobre Guia Michelin no forno).

 O vinho que descobri foi um verde branco que me deu vontade de chorar.

Eu e o sommelier gastamos um tempinho metendo o pau em vinho caro de rótulo… (eu estava pagando, e muito, portanto o sommelier concordava com tudo que eu falava).

Eu perguntei e ele me serviu a última garrafa da casa: Granito Cru 2022, Luís Seabra.

Um vinho verde para matar de alegria qualquer um.

De quebra, fui à cozinha bater um papo com o chef/dono, José Avillez.



Do começo humilde até os dias de hoje, com um mini-império, mas ainda na cozinha.

Recomendo ver o Anthony Bourdain em Lisboa com o Avillez bem novinho… na cozinha!

Acho que foi em 2008, o episódio.

Vá ao Belcanto sem dó de gastar, pois vai gastar bem (800 euros para dois no meu caso).



 O óleo de oliva servido foi o melhor da minha vida, o pão sourdough feito por Deus.

O ovo com raspas de ouro já é um clássico dele, mas não esperava que fosse tão bom.

Voltarei, certamente.

Lisboa, um lugar onde comer mal e caro é tarefa de gente com muito azar.

Lisboa.....Ande, ande, ande.

Não economize as pernas. Vale seu tempo (curta também as filas no aeroporto na chegada e na partida. As 4 horas de fila passam rápido).



A terra de Cabral renova minhas esperanças extintas.

Bonzo

quarta-feira, 6 de agosto de 2025

A ESTRELA CADENTE

 


Um comentário, na matéria “ Na Contramão”, publicada por Dionísio, chamou minha atenção.

O “anônimo”, queria saber qual minha opinião acerca dos restaurantes ungidos com a famosa estrela Michelin.



Confesso que, nos primórdios de minhas viagens gastronômicas, nutria uma irresistível atração pelas estreladas panelas do gordinho dos pneus.



Já não lembro quantos “estrelados” frequentei em minhas viagens pela Europa, mas confesso que aos poucos, mas irremediavelmente, a paixão foi diminuindo, sumindo e, finalmente, já não existe.

Hoje frequento raríssimas vezes os “Michelin”; a estrela brilhante já perdeu sua auréola, sua proverbial independência e aquele manto de virginal pureza



O guia “Michelin” já não seduz nem convence como no passado, pois parece ter perdido o contato com os comuns mortais e como eles querem e o que comer. 



A “Estrela” continua premiando apenas locais luxuosos cujas cozinhas selecionam e oferecem apenas ingredientes raros e caros que são apresentados, com pompa exagerada, aos clientes endinheirados e suas silenciosas, glamorosas e deslumbradas acompanhantes.



A fórmula da Michelin que, por mais de um século fez sucesso, cansou e começou sua irreversível e implacável caída.

 Um dos sintomas mais visíveis da decadência é facilmente perceptível ao verificamos o número, sempre maior, dos restaurantes “Michelin” que fecharam as portas ou, renunciando à famosa estrela, buscam novos (ou velhos...) caminhos fugindo da crise e custos insustentáveis.

Alguns chefs já nem aceitam a Estrela Michelin.



Um dos mais radicais inimigos do guia é o famoso chef Marc Veyrat que, em seu novo endereço em Megève, pendurou um cartaz com o seguinte aviso: “Proibida a entrada dos inspetores do Guia Michelin”



Os comuns mortais cansaram de cozinha molecular, emulsificações, aromatizações, crio-congelamentos estranhas espumas coloridas etc. ; querem retornar à cozinha “terrestre”, tradicional, com molhos, ervas, massas, carnes, peixes, que possam ser identificados como tais, e não pratos que lembram (até nos preços) quadros de Modrian, Pìcasso, Miró, Kandinsky etc.


Eu, não tendo nenhum parentesco nem admiração pelos reis magos, não sigo estrela “cadentes”.....



 Viva a cozinha tradicional, sadia e.....barata.

Na próxima matéria uma receita antiga, um clássico da cozinha piemontesa

Bacco

quarta-feira, 23 de julho de 2025

NA CONTRAMÃO

  


O Brasil, vinícola, parece ter tendências e desejos naturais, quase incontroláveis, que o obrigam a correr na contramão da história.

O tolo impulso, de andar na contramão, se revela mais uma vez, pois, enquanto o mundo do vinho passa por uma crise, quase tão grave quanto a da filoxera, no Brasil a carnavalesca euforia vinícola parece não ter limite e muito menos, fim.



Alimentadas, talvez, pelo sucesso financeiro obtido por produtores nacionais, que conseguem cobrar preços “suíços’ por vinhos “sergipanos” (sim, acredite... até em Sergipe há produtor de quase vinhos), pipocam, em quase todo território nacional, mais e mais vinícolas que, após uma ou duas colheitas, já ostentam “merdalhas” obtidas nos incontáveis concursos picaretas que emporcalham e avacalham o mundo do vinho.



O Brasil tropical, além de bonito por natureza e abençoado por um Deus cristão, é hoje o favorito de uma divindade pagã: Baco.

Baco, para o desespero dos predadores gaúchos, desde sempre maiores produtores de “tremendas-bostas”, em um passe de mágica, resolveu realizar a multiplicação das vinhas em todos os rincões do Brasil.



Baco, o deus pagão, embarcou em um pau de arara, deixou o “terroir-terror”, gaúcho para trás e começou sua romaria, sem fim, pelo imenso Brasil.

Baco multiplicou vinhas nos lugares mais impensáveis e improváveis, assim, hoje, seu “milagre-do-vinho” está presente, pasmem, no cerrado de Goiás e do Distrito Federal, na Bahia, Espírito Santo, Minas Gerais, Ceará, Sergipe, Pernambuco, São Paulo, Rio de Janeiro e acredite, se quiser e puder, até no Pantanal mato-grossense.



É o milagre da multiplicação das “Vinhas da Ira”.

Não estou me referindo ao livro de John Steinbeck e muito menos ao filme homônimo.



A ira, neste caso, é aquela que atormenta, sem piedade, a vida dos enófilos brasileiros que pagam $$$$$$ por “eno-tremendas-bostas” que não valem nem 10% do que custam.



O lucro fácil e exagerado, que norteia e domina o setor vinícola nacional, incentivou muitos aposentados, empresários, arrivistas, sonhadores, predadores, profissionais liberais e até bombeiros, a investir no plantio de parreiras, em todos os cantos do Brasil, quase sempre sem cuidado, preocupação, conhecimento ou mínimo de estudo.



Os novos Leroy, Guigal, Leflaive, Gaja, Conterno, Hochar etc. do Brasil, imitando seus colegas do Rio Grande do Sul, produzem apenas tremendas-bosta-caras e apostam no sucesso de suas garrafas comprando estrelas, taças, pontos, medalhas etc. das sempre disponíveis canetas de vida fácil que, mediante $$$$$, elogiam qualquer zurrapa e até aquela obscenidade que atende pelo nome de “Pérgola”.



Enquanto assistimos à incrível expansão das vinhas, no paraíso tropical, abençoado por Baco e ridículo por natureza, no restante do mundo vinícola, como já mencionei, no início da matéria, há uma crise que piora a cada dia, sem luz no final do túnel e nenhum sinal de um final feliz.

Nas adegas italianas mofam, por falta de compradores, mais de 44 milhões de hectolitros de vinho (quase 6 bilhões de garrafas).



Na França, nos últimos 12 meses, faliram 255 empresas vinícolas.



O governo francês financiará a erradicação de 30.000 hectares de vinhedos e nos supermercados gauleses é fácil encontrar garrafas de Bordeaux por 1,99 Euro (a segunda garrafa sai por 1,39 Euros)



Na Espanha, nos últimos 10 anos, nada menos que 187.000 propriedades vinícolas deixaram de existir e.....Por aí vai.

Entre os muitos problemas, que atingem o mundo do vinho, há a mudança no gosto e preferência dos jovens que consomem sempre mais cerveja, coquetéis ou outras bebidas alcoólicas, deixando o vinho como terceira ou quarta opção.



Outra, mas não menor preocupação: os jovens preferem beber vinhos brancos, rosés, espumantes ou tintos leves.

Tintos impenetráveis, pesados e muito alcoólicos, enfrentam sempre mais dificuldades para encontrar consumidores e acabam mofando nas adegas dos produtores.

Enquanto isso, no Brasil da contramão, há quem continue bebendo Amarone com 16º.



Parabéns, produtores e fãs dos vinhos nacionais….vocês   se merecem.

Dionísio