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quarta-feira, 23 de julho de 2025

NA CONTRAMÃO

  


O Brasil, vinícola, parece ter tendências e desejos naturais, quase incontroláveis, que o obrigam a correr na contramão da história.

O tolo impulso, de andar na contramão, se revela mais uma vez, pois, enquanto o mundo do vinho passa por uma crise, quase tão grave quanto a da filoxera, no Brasil a carnavalesca euforia vinícola parece não ter limite e muito menos, fim.



Alimentadas, talvez, pelo sucesso financeiro obtido por produtores nacionais, que conseguem cobrar preços “suíços’ por vinhos “sergipanos” (sim, acredite... até em Sergipe há produtor de quase vinhos), pipocam, em quase todo território nacional, mais e mais vinícolas que, após uma ou duas colheitas, já ostentam “merdalhas” obtidas nos incontáveis concursos picaretas que emporcalham e avacalham o mundo do vinho.



O Brasil tropical, além de bonito por natureza e abençoado por um Deus cristão, é hoje o favorito de uma divindade pagã: Baco.

Baco, para o desespero dos predadores gaúchos, desde sempre maiores produtores de “tremendas-bostas”, em um passe de mágica, resolveu realizar a multiplicação das vinhas em todos os rincões do Brasil.



Baco, o deus pagão, embarcou em um pau de arara, deixou o “terroir-terror”, gaúcho para trás e começou sua romaria, sem fim, pelo imenso Brasil.

Baco multiplicou vinhas nos lugares mais impensáveis e improváveis, assim, hoje, seu “milagre-do-vinho” está presente, pasmem, no cerrado de Goiás e do Distrito Federal, na Bahia, Espírito Santo, Minas Gerais, Ceará, Sergipe, Pernambuco, São Paulo, Rio de Janeiro e acredite, se quiser e puder, até no Pantanal mato-grossense.



É o milagre da multiplicação das “Vinhas da Ira”.

Não estou me referindo ao livro de John Steinbeck e muito menos ao filme homônimo.



A ira, neste caso, é aquela que atormenta, sem piedade, a vida dos enófilos brasileiros que pagam $$$$$$ por “eno-tremendas-bostas” que não valem nem 10% do que custam.



O lucro fácil e exagerado, que norteia e domina o setor vinícola nacional, incentivou muitos aposentados, empresários, arrivistas, sonhadores, predadores, profissionais liberais e até bombeiros, a investir no plantio de parreiras, em todos os cantos do Brasil, quase sempre sem cuidado, preocupação, conhecimento ou mínimo de estudo.



Os novos Leroy, Guigal, Leflaive, Gaja, Conterno, Hochar etc. do Brasil, imitando seus colegas do Rio Grande do Sul, produzem apenas tremendas-bosta-caras e apostam no sucesso de suas garrafas comprando estrelas, taças, pontos, medalhas etc. das sempre disponíveis canetas de vida fácil que, mediante $$$$$, elogiam qualquer zurrapa e até aquela obscenidade que atende pelo nome de “Pérgola”.



Enquanto assistimos à incrível expansão das vinhas, no paraíso tropical, abençoado por Baco e ridículo por natureza, no restante do mundo vinícola, como já mencionei, no início da matéria, há uma crise que piora a cada dia, sem luz no final do túnel e nenhum sinal de um final feliz.

Nas adegas italianas mofam, por falta de compradores, mais de 44 milhões de hectolitros de vinho (quase 6 bilhões de garrafas).



Na França, nos últimos 12 meses, faliram 255 empresas vinícolas.



O governo francês financiará a erradicação de 30.000 hectares de vinhedos e nos supermercados gauleses é fácil encontrar garrafas de Bordeaux por 1,99 Euro (a segunda garrafa sai por 1,39 Euros)



Na Espanha, nos últimos 10 anos, nada menos que 187.000 propriedades vinícolas deixaram de existir e.....Por aí vai.

Entre os muitos problemas, que atingem o mundo do vinho, há a mudança no gosto e preferência dos jovens que consomem sempre mais cerveja, coquetéis ou outras bebidas alcoólicas, deixando o vinho como terceira ou quarta opção.



Outra, mas não menor preocupação: os jovens preferem beber vinhos brancos, rosés, espumantes ou tintos leves.

Tintos impenetráveis, pesados e muito alcoólicos, enfrentam sempre mais dificuldades para encontrar consumidores e acabam mofando nas adegas dos produtores.

Enquanto isso, no Brasil da contramão, há quem continue bebendo Amarone com 16º.



Parabéns, produtores e fãs dos vinhos nacionais….vocês   se merecem.

Dionísio

quarta-feira, 9 de julho de 2025

MALVASIA ISTRIANA

 


Há muitos anos os melhores restaurantes da região, para se beber bons e econômicos vinhos, continuam sendo “Nanim” em Chiavari, “Bricco della Gallina” em Breccanecca”, antes no “Rêve” e agora na “La Nuova Cesarina”.

Marco, Enrico e Matteo, além de mestre das panelas, possuem um faro privilegiado para descobrir grandes garrafas.



Grandes garrafas e não garrafas estrelares apontadas e endeusadas pelas revistas, influencers, sommelier, críticos e outros picaretas do gênero.

Não tenho a mínima vergonha, nem receio, em confessar que eles me ajudaram a descobrir “os caminhos das pedras” de algumas das melhores etiquetas que já bebi.



Marco foi meu mestre da Borgonha e Monferrato, Enrico meu guia da Ligúria, Toscana e Marche e Matteo foi o que me incentivou a ser um eno-cigano vagando por raras etiquetas de Champagne, Barolo, Vermentino, Pigato e finalmente Malvasia Istriana.



Matteo, sem mostrar a etiqueta e quase solenemente, derramou um pouco de vinho na taça e ..... “Prove com calma este branco de 2021, se você gostar vou servir um de 2013”.

Intensa e brilhante cor dourada, “lagrimas” que lentamente escorriam na taça, denunciavam a presença de glicerina, presença que se confirmou, já no primeiro gole, quando a maciez, cremosa e quase aveludada, invadiu o paladar.



Um vinho complexo, de longo e persistente final......Uma taça intrigante, muito interessante e, até aquele instante, “misteriosa”.

Matteo, em seguida e conforme prometido, serviu o 2013.

Um vinho branco, desconhecido, (quando Matteo revelou o preço, fiquei de queixo caído…), que apresentava complexa intensidade olfativa, uma grande estrutura e, apesar de seus 12 longos anos, mantinha um elegante e incrível frescor.



Matteo, ao ver minha cara incrédula e apatetada, revelou o segredo: “Malvasia Saltimbanco” produzida, no vale Vipava (Eslovênia), pela desconhecidíssima “La Giostra del Vino” (O Carrossel do Vinho).

“La Giostra del Vino” nasce, em 2002, na Argentina, pelas mãos e cabeças dos Italianos Giuseppe Franceschini, Dario Maurigh e o holandês Jacques Hoogeveen.

Os dois enólogos italianos cuidam da produção e o holandês se encarrega da comercialização.



”La Giostra”, depois de alguns anos na Argentina, produzindo Malbec, desembarca no Friuli e Eslovenia onde inicia a produção de Pinot, Noir, Sauvignon, Ribolla, Malvasia, Friulano, Refosco etc.

O mais interessante que a empresa possui pouquíssimos hectares próprios, mas, depois de cuidadosas seleções, aluga pequenos vinhedos onde com extremo cuidado, desde a manutenção, poda, colheita e finalmente vinificação, produz verdadeiras joias enológicas.



Quanto custa a Malvasia Saltimbanco?

Matteo, que não me cobrou um centavo pela degustação, revelou ter pago 13 Euros pelos 2021 e 14 Euros para levar à adega 18 garrafas de 2013.

Mais uma coisinha: A produção anual da “Malvasia Saltimbanco” não ultrapassa as 1.000 garrafas.



Você, que comprou um “Vista do Bosque Viognier”, da Gua$pari, por R$359,00, um “Semillon” da Pizzato por R$ 190,00, um “Chardonnay la Cave” da Luiz Argenta por R$ 210,00 é visto, pelos predadores nacionais, como um perfeito eno-pateta

Bacco