Recebemos um comentário que, por sua importância, merece um contra
comentário.
1.
Prezado Bacco e Bocca,
Sou leitor assíduo deste blog e comumente compartilho o mesmo ponto de vista
apresentado nas matérias publicadas aqui, mas não é o caso em relação aos dois
últimos posts. Primeiro, o preço médio no mercado SECUNDÁRIO de uma garrafa de
Romanée - Conti gira em terno de 10 mil euros (diferente dos 15 mil citados na
matéria anterior), enquanto uma garrafa de Montrachet custa em média 3.200
euros ( já mais próximo ao valor de 4 mil citado na outra publicação). Analisando
ainda os preços do mercado secundário é possível conseguir adquirir estes
vinhos em lojas CONFIÁVEIS por preços bem menores, como é o caso do Montrachet
2011 (última safra lançada pela DRC) pelo preço de 1.773 euros na loja Premier
Cru em Berkeley - CA, já o Romanée - Conti 2011 sai por 5.725 euros nesta mesma
loja.
Pude
perceber que Thales precisou pesquisar, e muito, para conseguir preços menores
daqueles que eu indiquei.
Thales encontrou, em Berkeley, Romanée-Conti por míseros 5.725 Euros.
O problema é que Berkeley não é um
centro turístico que visito com frequência e ir até lá, somente para comprar
uma garrafa de vinho, não me parece decisão muito inteligente.
Vejamos: Eu estou em Mâcon, Beaune ou Alba
e resolvo comprar uma garrafa de Romanée-Conti.
Procuro em diversas enotecas da cidade
e não encontro o vinho por menos de 15.000 Euros (ano passado procurei em Beaune, para um amigo de um amigo, e o preço mínimo,
naquele dia, era de 17.000 Euros).
O proprietário da enoteca me
confidenciou que o preço estava assim inflacionado, pois, na semana anterior
uma invasão russa havia limpado o estoque.
Não
encontro, mas não me rendo!
Consulto o Google e depois de várias pesquisas,
em Berkeley, na Califórnia, encontro uma loja que vende o Romanée-Conti por míseros 5.725 Euros.
Sim, mas Berkeley dista quase 10.000 km
de Mâcon...
E agora, o que faço?
Pego três ou quatro aviões, chego
finalmente em Berkeley, compro a garrafa, provavelmente falsificada, e retorno
feliz para o Brasil?
É uma “pechincha”, mas no frigir dos
ovos (ou bagos) quanto gastei?
Respostas, por favor.....
Após feito a análise dos preços no
mercado secundário, vamos realmente ao mercado PRINCIPAL e o preço VERDADEIRO
destes vinhos.
A DRC vende os seus vinhos através de um "mailing list" e um sistema
de cotas. Normalmente existe um importador oficial em cada país (não lembro de
nenhum que haja mais que um) e estes importadores recebem uma determinada
quantidade de garrafas e revendem para uma seleta lista de clientes. O
importador no caso da Itália (país onde acredito que vc reside) é a SAGNA SPA,
nos EUA é a Wilson and Daniels, na Inglaterra a Corney and Barrow, no Brasil a
Expand e assim vai. Vamos pegar o exemplo da Corney and Barrow da inglaterra, o
preço de um RC 2011 é de 1825 Libras Esterlinas a garrafa ou 5.475 Libras
Esterlinas em uma caixa de 3 garrafas, ou seja, 4 vezes mais barato que no
mercado secundário. Para fazer parte desta seleta lista das importadoras, vc
deve ser um grande comprador dos vinhos da DRC e da Borgonha em si durante
décadas.
Na mosca!
A vinícola Romanée-Conti somente vende
para os mesmos importadores, ou para alguns tradicionais e fieis clientes, há
décadas.
O Thales esqueceu um pormenor: A
Domaine Romanée-Conti não vende, nem para o arcanjo Gabriel, somente o Romanée-Conti.
Para cada 12 garrafas, do mítico vinho, a vinícola
“empurra” 50 outras etiquetas da Domaine.
Se
o importador chiar.... chia uma única vez.
Ou seja, as pessoas que compram estes
vinhos conhecem muito bem o que estão comprando e sabem identificar o que estão
bebendo e passam longe do que vc disse ( Bacco e Bocca : " É bom salientar
que 99,99% dos que compram o Romanée-Conti, ou um Montrachet da mesma Domaine,
não sabem identificar o que estão bebendo" ). As pessoas que sei que fazem
parte destas listas, são grandes conhecedores e facilmente identificam os
vinhos da DRC as cegas. Além de muitos não tratarem estes vinhos como questão
de status, quando adentraram a lista, os valores e a fama da DRC e de outros
produtores da borgonha em geral eram completamente diferentes.
Caro Thales, quantas garrafas produz a
Domaine de Vosne-Romanée a cada safra?
Nas colheitas de 2001 até 2010 foram produzidas 45.084
unidades.
O número aponta para uma média anual de
pouco mais de 4.000 garrafas.
Se 4.000 garrafas forem divididas entre
1.000 fieis clientes e fácil deduzir que nossos afortunados milionários poderão
degustar 4 unidades/ano.
Se os afortunados fregueses forem 2.000,
apenas 2 garrafas/ano descerão pelas sofisticadas goelas.
O Romanée-Conti nunca é bebido na mais
triste solidão.
O Romanée-Conti é sempre compartilhado
para que se possa, justamente, exibir poder, bom gosto, riqueza, sofisticação
e, não raramente, idiotice.
O que quero demonstrar é que 2 ou 4
garrafas por ano não bastam para habilitar um paladar, por mais refinado que seja,
a reconhecer, às cegas, nenhum vinho, nem mesmo o Romanée-Conti.
É bom salientar também que a DRC é totalmente contra a política de preços
praticada no mercado secundário. Eles querem que seus vinhos sejam consumidos e
não virem troféus, e para isso eles tomam diversas ações. Uma dessas ações é
que ao comprar alguma garrafa, o cliente aceita um termo da importadora em que
diz que caso ele queira vendar alguns destes vinhos dentro de um determinado
prazo, ele terá que oferecer primeiramente a garrafa para a importadora
recomprar a mesma, caso ele não faça isso ele perde a sua cota de garrafas no
próximo ano. Isso ajuda controlar o mercado secundário e há realmente algumas
fiscalizações e rastreamento do número de série.
Quando se abre o site da Domaine de La Romanée-Conti,
salta aos olhos a advertência da vinícola para o perigo de falsificação que ronda,
sem piedade, suas garrafas.
Thales, vimos que pouco mais de 4.000
garrafas são produzidas anualmente pela Domaine cujo destino é sempre o mesmo:
Revendedores autorizados e clientes antigos e fieis.
Não sei se você conhece Brasília, mas
posso afirmar, com absoluta certeza, que na capital do Brasil há inúmeros
restaurantes que ostentam em suas cartas o Romanée-Conti.
Além dos restaurantes algumas enotecas
vendem Romanée-Conti e são muitas as adegas privadas que escondem em suas
entranhas garrafas e mais garrafas de precioso vinho.
Posso afirmar, com absoluta certeza,
que em Brasília há centenas de garrafas de Romanée-Conti.
Já imaginou quantas garrafas há em São Paulo,
no Rio, em New York, Londres, Paris, Roma, Moscou, Pequim, Tóquio, sem falar
que até em Chiavari, na enoteca Defilla, há uma boa quantidade de garrafas de Romanée-Conti
armazenadas?
Já pensou quantas existem nos
restaurantes “Estrelas Michelin”
espalhados pelo mundo?
Uma informação: Há, espalhados pelo mundo, 2.604 restaurantes ostentando a estrela
Michelin.
Não ouso arriscar e tentar adivinhar
quantas garrafas de Romanée-Conti há nas adegas dos “estrelados”, mas, só para
dar uma ideia, garanto que no “La Ciau del Tornavento”, na pequena
Treiso, há mais de uma dúzia delas estocadas.
De onde surgem tantas garrafas?
Da mesma fonte de onde saem centenas de
milhares de “Ralex”: falsificação.
Thales, quando um produto atinge preços
estratosféricos a falsificação aparece e nunca mais desaparece.
É bom lembrar que falsificar uma
garrafa de vinho é quase uma brincadeira de criança (até na Serra Gaúcha falsificam vinho nacional).
Quando a garrafa se transforma em um troféu, que deve ser exibido e não bebido,
a falsificação, então, é uma moleza.
Para terminar: Há muito mais “Romanii-Konti”, do que Romanée-Conti, espalhados
pelo mundo.
Dionísio
PS. Corrigindo: pela quantidade
produzida de garrafas de Romanée-Conti, os enófilos que poderiam reconhecer, às
cegas, o vinho original, passa de 0,01% pra 0,0000001%
Salute.