“Sábado churrasco lá em casa”....Um amigo
mandou a mensagem me convidando para o enésimo almoço de final do ano.
Apesar de não ser, exatamente, um amante de churrascos, não
teria sido elegante recusar o convite, assim, em um sábado, nublado e chuvoso,
acompanhado por uma garrafa de vinho tinto e pouco entusiasmo, ao meio-dia,
apertei a campainha da casa do amigo.
Na churrasqueira, oito convivas, já haviam iniciado as
libações enquanto comiam a inevitável linguiça assada.
Bons papos, muita alegria, muito vinho, muita cerveja....clássica
atmosfera de um churrasco entre amigos.
Amigos? Quase todos...
Ao perceber que o vinho estava escasseando, resolvi, mais que
depressa, abrir a garrafa de Chianti Ruffino 2017, que havia trazido.
Receoso, que o Chianti
não tivesse suportado os 8 anos de adega, degustei, aprovei e ofereci uma taça
ao dono da casa que, agradecido, resolveu me elogiar: “Dionísio,
um sommelier que realmente entente de vinhos”
Risadas, gozações, desafios, assovios…zorra total.
Quando a “bagunça” perdeu força, arrefeceu e a calma voltou, um
dos convidados, o único do grupo que eu não conhecia, exclamou: “Deixei de ler o que
escrevem, em B&B, porque desprezam, sistematicamente e sem razão o vinho
nacional”
Um silêncio quase sepulcral se abateu sobre o animado churrasco.
Os amigos, que conhecem
meu temperamento, me olharam esperando ouvir um sonoro “Vá à merda”.
É possível que espirito natalino, naquela ocasião, tenha
edulcorado minhas reações, assim, sem perder a calma e sorrindo, respondi que não
bebia vinho nacional pois meu intestino era bastante regular e não necessitava
de estimulantes.
A minha irônica resposta, foi recebida com muitas risadas, mas
deixou o eno-patridiota ainda mais irritado, agressivo, que continuou: “Como pode
criticar sem ao menos degustar as etiquetas nacionais que já são conhecidas e
premiadas até na Europa? ”
Notei que a discussão estava evoluindo para a lado pessoal e
percebi que, naquela ocasião e lugar, não seria educado começar uma discussão
acalorada e, além do mais, não estava, eu, com muito entusiasmo e paciência
para argumentar com um eno-patriota-raiz.
Decidi que não adiantaria afirmar que um pais, cuja produção
vinícola é obtida esmagando 80% de uvas não viníferas, não pode ser levado a
sério, que prêmios e medalhas podem ser comprados nos milhares de concursos
picaretas espalhados pelo mundo e que qualquer vinho chileno, de R$ 60/80,
pulverizaria as caríssimas, mas banais etiquetas nacionais.
De nada adiantaria argumentar que nosso território e clima não
são os mais indicados para o cultivo da uva, que a viticultura brasileira não é
reconhecida por ser exemplo de proverbial seriedade, que é controlada por
algumas dezenas de predadores picaretas e que até os pequenos produtores já
aprenderam que a propaganda é mais importante e lucrativa do que seriedade e qualidade.
O “discurso”, acima, apenas acirraria, sem necessidade ou
razão, o enfadonho e estéril debate
Encerrei a discussão
garantindo, ao altivo e agressivo eno-patridiota, que compraria algumas garrafas
de vinho nacional, de nossos “premiados” predadores vinícolas e outras de normais
e comuns vinhos chilenos, assegurando que, após degustá-los, escreveria uma
matéria comentando o resultado ......Aqui estou, cumprindo a promessa.
Ao entrar, em uma renomada enoteca de Brasília, me dirigi
diretamente à secção de vinhos nacionais para escolher um Chardonnay.
Pizzato R$ 145, Valduga Terroir R$ 97, Lidio Carraro Dadivas R$
128, Miolo R$ 73, Casa Perini Fração Única R$ 89.....
Casa Perini?
Lembrei de uma pavorosa Barbera que motivou uma acalorada discussão com Diego Arrebola (nosso eterno “melhor sommelier do Maranhão”), discussão que acabou com Diego me ameaçando com um processo por difamação.
Começou assim.... https://baccoebocca-us.blogspot.com/2017/02/barbera-perini.html
.....e terminou assim "Ok Dionísio Ramos, já deu... Como já disse, respeito, mesmo, suas opiniões, mas não dá para debater com essa profusão de insultos gratuitos de sua parte. 1 - Não ganho para falar mal ou bem de vinhos. Você pode duvidar de mim, pode até insinuar o contrário. Mas, do ponto de vista legal, você sabe que não pode AFIRMAR isso como você fez aqui. Estou ciente de que outros já te processaram no passado, e tiveram dificuldades por conta de você não estar aqui no Brasil, mas não me custaria nada entrar para o clube e buscar um acerto judicial com você
Em homenagem ao “eterno-quase-melhor-sommerdier” decidi
comprar uma garrafa de “Fração Única”,
esperançoso e curioso, para verificar se “Casa Perini” teria aprendido vinificar decentemente.
Para concorrer, com o Chardonnay Nacional, não escolhi uma
garrafa dos meus chilenos preferidos, Cousiño Macul e Tarapacá, mas uma da “Viu Manent”.
O ilustre e desconhecido Chardonnay, “Viu Manent Reserva” (nunca havia
bebido um vinho da Viu Manent), me
aliviou em exato R$ 57,90.
No dia seguinte retirei as garrafas do refrigerador, as abri e
derramei alguns dedos em duas taças idênticas.
Já no exame visual era fácil notar grande diferença.
O Chardonnay chileno apresentava a característica cor
amarelo-palha com reflexos esverdeados;
O Perini, quase incolor, parecia um Sauvignon Blanc no qual
haviam adicionado um pouco de água.
No nariz as diferenças continuaram: O “Fração
Única” não emanava quase
nenhum aroma que recordasse, mesmo remotamente, o Chardonnay, enquanto no “Viu
Manent” foi fácil perceber notas minerais e cítricas típicas da casta.
Na boca, a tragédia final.... Uma tremenda bosta!
Qualquer consumidor europeu, ao beber o aguado Perini “Fração Única”,
perguntaria quem tivera a coragem de etiquetá-lo como se fosse um Chardonnay
Quase incolor, aromas parcos e quase inexistentes, na boca
lembrou-me o refrigerante H2OH!
“Fracção Única” é um vinho que deveria ser proibido de
ostentar, na etiqueta, o nome: “Chardonnay”.
A etiqueta, por sinal, tão falsa, ou mais até, do que o
conteúdo liquido da garrafa, declara: “Maturação: 4 meses em barriques de carvalho
francês e americano”
A Perini deveria ter vergonha em afirmar tamanha mentira: O “Fração Única” nunca viu nem a sombra, nem o
formato e muito menos o interior de uma barrique.
Terminei a dantesca e “purgatorial” degustação, do vinho
nacional, amaldiçoando os vapores alcoólicos que me fizeram prometer, ao
eno-patridiota, que a realizaria.
Traumatizado, mas ainda consciente, consegui alcançar a
garrafa do “Viu Manent” e já no primeiro gole, do Chardonnay chileno, meu
olfato, paladar e outros sentidos voltaram ao normal.
Ao levantar a taça, para mais um gole ouvi um sussurro quase
inaudível ....
Consideração final: O Barbera Perini é um horror, mas o
“Fração Única” consegue ser pior.....
Dionísio





O connoisseur está sumido, estaria ele no churrasco do Dionísio? Kkkk
ResponderExcluirEstive recentemente no Sul, nas vinícolas. Minha opinião sincera sem ufanismo nem sarcasmo: a maior parte das vinícolas faz um produto apenas "ok", abaixo dos países vizinhos. Algumas produzem até um bom tinto, acredite, mas todas em que achei um tinto com certa qualidade compartilhavam duas características: 1- vinicola pequena. 2- preços caríssimos e injustificaveis (na casa dos R$300). Exemplo: vinhos da linha top da torcello. Estão experimentando tudo pra ver se cola, saíram do merlot pra touriga nacional, alicante, terodelgo, aragonez, nebbiolo... cada safra uma uva nova pra "ver se emplaca", mas sem muito sucesso.
ResponderExcluirNos espumantes a história é melhor, não que os vinhos sejam grandes coisas, mas a facada é muito mais leve, enquanto os bons tintos custam 300, espumantes até que razoáveis custam 70...80... está mais adequado.
Como dica, deixo um tinto que me surpreendeu positivamente e custou "pouco" pros padrões gaúchos: Marco Luigi touriga nacional 2020. 90 reais, justo.
Aproveito para dizer ao colega Dionísio que a Cousino (Chilena) é realmente um espetáculo de custo/benefício. Além de ser a única vinícola de qualidade perto de Santiago, já visitei, gostei. A linha top deles é excelente mas tem mais madeira que a arca de noe.
Taga.