O ato de beber vinho, até os anos 1970, era banal, corriqueiro e simples.
Não era considerado glamoroso nem refinado: bebia-se e pronto.
Não havia modismos, não
existiam indicações de sommeliers, críticos, experts, formadores de opinião
etc. e não era “obrigatório” encontrar dúzias de recônditos aromas, inúmeros
sabores e raras sensações.
Pedia-se um vinho,
quase sempre “da casa” e ninguém exigia taças Riedel, Zalto o outro precioso
cristal.
Na Itália, dos anos 70,
bebia-se, basicamente, vinhos locais e os “importados” não tinham vez.
É preciso esclarecer
que os “importados” eram vinhos produzidos em outras regiões italianas.
Exemplo: O piemontês não conhecia e nunca provara um Nero D’Avola,
o toscano nunca molhara a boca com um Taurasi, o sardo nunca ouvira falar do
Sagrantino di Montefalco, o veneziano nem desconfiava que existia o Primitivo di Manduria
e....... por aí vai.
Havia poucas e raras exceções que “ousavam” ultrapassavam as
fronteiras, entre elas e mais famosas, o Lambrusco e o Chianti.
Não posso afirmar exatamente quando tudo mudou e o vinho
encontrou e resolveu enveredar o caminho da “moda”, mas arriscaria uma data provável:
início dos anos 1980.
Os responsáveis, pela mudança do comportamento, foram o boom
econômico europeu e Robert Parker.
Parker, grande farejador e oportunista, percebeu que vinho era
um campo quase virgem, emergente e promissor.
Sem pensar muito, no
final dos anos 1970, mandou sua carreira de advogado às favas e, já em meados
dos anos 1980, com suas degustações pontuadas, norteava os gostos e
preferencias de um sem número de seguidores.
Começava a “Moda Parker” dos vinhos alcoólicos, impenetráveis,
amadeirados, superconcentrados (marmelada) etc. feitos sob medida para a
alegria de milhões de enoloides.
Além da sedução, dos “pontos parkerianos”, era preciso
promover e endeusar uma figura até então desconhecida: O enólogo!
Os enólogos, durante algumas décadas, foram endeusados e
reverenciados como se fossem stars hollywoodianas.
O “enólogo-star” e símbolo máximo, da era “Parker, ” foi o Michel Rolland.
Rollando Lero, com seus vinhos todos estandardizado,
excesso de madeira, bombas frutadas e uma boa dose de química, conseguiu,
através de centenas de consultorias, espalhadas pelo mundo (até no Brasil), impor
o modelo “Parker” como o padrão a ser seguido.
Nascia o vinho “internacional”
A importância e admiração dedicada ao “enólogo-pop-star”, no Brasil,
chegou a ser ridícula: apertar a mão do Michel Rolland, ou outro winemaker
qualquer, era a glória dos diretores da ABS e provocava orgasmos nos críticos, enófilos,
sommeliers, formadores de opinião etc.
Cavalgando a onda parkeriana o vinho virou grife e a cada
ponto (acima dos 90), concedido pelo ex advogado, provocava uma frenética busca
das etiquetas incensadas e consequentemente uma verdadeira corrida para
remarcar os preços.
Chegamos, assim, à moda
da imbecilidade total: Vinhos de grife, de alta moda, custando U$
500-1.000-3.000 e se mais enoloide houvera, lá chegara......
Os pontos parkerianos, há alguns anos, já no fazem muito sucessos,
os vinhos “internacionais” cansaram os consumidores, os enólogos já não são tão
endeusados e o brilho de sua presença já não ofusca as mentes …perderam o
charme inicial.
Estava aberto o caminho para o aparecimento de uma nova moda,
a moda dos “Vinhos com grande identidade territorial”
Quem havia investido nos “internacionais” fez rapidamente o
”meia-volta-volver” e tudo voltou para os anos 1970.
Quem havia apostado em vender Barbera e Dolcetto com 15° de
álcool e por preço de Barolo, perdeu a aposta e seus vinhos mofam nas
prateleiras.
Exemplo: As Barbera “Pomorosso” da Coppo, “Spinetta” da
vinícola homônima (Euros 45) e a magnum “Pozzo dell’Annunziata” de Roberto Voerzio
(Euros 280) aguardam nas empoeiradas prateleiras os sempre mais raros e ralos
turistas enoloides.
O mercado inquieto, como sempre, precisava encontrar uma nova
motivação, uma nova moda para manter aceso desejo do novo, do consumo.
Não foi difícil e quase ao mesmo tempo surgiram os vinhos,
biológicos, biodinâmicos e naturais.
Três novidades, três picaretagens.
Produzir vinhos biológicos na Europa é praticamente
impossível.
Exemplo: Há, na Itália, 310.428 empresas vinícolas que dividem os
atuais 652.000 hectares de vinhedos. Um pequeno exercício matemático nos leva à
média de pouco mais 2 hectares para cada produtor.
Há alguns “grandes” proprietários com 20-50-150 hectares, mas
a média continua sendo de 2 hectares.
Na França (media 6 hectares), Espanha (3 hectares) e em Portugal,
o panorama pouco muda.
Aí faço uma pergunta: Como pode um viticultor produzir
biologicamente se o vizinho, 3 metros além de sua “cerca”, usa e abusa do
glifosato?
Como pode o José, etiquetar seu vinho como sendo “biológico”
se seu vizinho, João, insiste em pulverizar suas vinhas, sei lá com qual
produto químico e o vento leva a nuvem branca sobre seu vinhedo?
Veja as fotos que tirei em Puligny-Montrachet e tire suas
conclusões.
A moda continua...
Bacco
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