Antes de começar minha segunda crítica, ao sommerdier de
bicicleta, peço escusas por ter esquecido, na matéria anterior, algumas “eno-malas-sem-alças” que vagaram pelo
patético e ridículo mundo vinícola brasileiro.
Entre os que não citei é preciso pedir tardias escusas ao
falecido Saul Galvão, um dos maiores pavões de todos os tempos (Beato Salu é
outro da mesma estirpe...)
Menção feita, vamos ao rotundo e risonho sommerdier memorável descobridor
do “...um
novo estilo que nasce por lá”.
Já alertamos e aconselhamos nosso sommerdier a consultar o
Google mais vezes pois seu “novo estilo” já era conhecido desde a década de
1930 e atende pelo nome de “Albarossa”.
Mas deixemos o Albarossa, por enquanto e voltemos ao “Selvaggia” do nosso ciclista.
O caro Pantani, das uvas, parece desconhecer totalmente
quantas outras vinícolas produzem o “...novo estilo que nasce por lá”
Provavelmente o Google não foi bem pesquisado, mas B&B
está, como de costume, pronto para ajudá-lo a poupar seu tempo e o informando
das dezenas de produtores que, também e bem antes, descobriram o “novo estilo”:
Marziano
Abbona, Batasiolo, Lo Zoccolaio, Paolo Manzone, Conterno Fantino, Ricossa, La
Spinetta, Pio Cesare, Pira, Marchesi di Barolo, Rocche dei Manzoni, Elio Altare,
Gaja, etc.
Há mais dezenas de outros produtores que, em busca de novos
mercados e do dinheiro dos eno-trouxas (uma garrafa de “Pin”, Nebbiolo/Barbera da Spinetta,
custa nada modestos 39 Euros) adoram vinificar “blend” com todas as
uvas disponíveis (francesas, como sempre, em 1º lugar)
O nosso eno-ciclista revela sua veia cômica quando começa a
descrever os aromas e sabores do “Selvaggia”.
Enrola, enrola e enrola tanto, que não pude deixar de
compará-lo ao “Rolando Lero” da saudosa “Escolinha do Professor Raimundo”.
O nosso Google-sommerdier inicia a degustação exclamando: “há... muito raro,
hehehe.... muito raro isso aqui galera, 2020, safra jovem, vinho tá macio no
paladar e frutado. Isso é raríssimo quando a gente fala de Barbera e
Nebbiolo....”
Nosso risonho e rotundo eno-ciclista desconhece o assunto e
precisa de ajuda.....
A moderna vinificação permitiu que o Barbera perdesse muito de
sua “rusticidade”, ganhasse elegância, frescor e apesar de sua ótima vocação ao
envelhecimento, pode tranquilamente ser bebido jovem.
A Nebbiolo doa, ao blend, corpo, maciez quase aveludada e
estrutura.
Não pude deixar de rir quando o risonho eno-ciclista repete
quase mecanicamente os manjados e risíveis aromas e sabores que são a marca
registrada dos sommerdiers que desejam nos impressionar com seus soberbos e infalíveis
narizes
O nosso sabujo de bicicleta é capaz
de identificar, em uma simples taça de vinho: flores brancas, vermelhas e secas, além de violetas,
rosas, ervas aromáticas, especiarias, framboesas, terra, trufas, frutas secas e
uma infinidade de outros odores e sabores.
Quando ouvi e vi a quantidade de aromas que nosso sabujo de
bicicleta conseguiu encontrar, na taça de “Selvaggia”, pensei: “Estou com
hiposmia”…telefonei imediatamente para meu otorrino e marquei
consulta.
Deixando a gozação, por um instante, só tenho mais uma
pergunta: Caro eno-ciclista quantas vezes teve contato,
cheirou e comeu groselha ou alcaçuz, para poder formar uma memória gustativa e
olfativa tão precisa?
Os leitores podem, também, responder e revelar quantas vezes encontraram
comeram alcaçuz e groselha no Brasil.
Deixemos, por enquanto, o risível mundo do “influencer” de
bicicleta e falemos de coisas sérias.
Por um feliz acaso, ao percorrer as gôndolas de um supermercado,
encontrei, vejam só, um “Albarossa”, da
vinícola Enzo Bartoli, por 6,49 Euros.
Sem pestanejar comprei duas garrafas, levei para casa, as
deixei “descansar” alguns dias e .... Afirmo, sem medo de errar, que não há um
vinho nacional, nem as caríssimas etiquetas como Sesmarias, Singular Nebbiolo, Guaspari
Terroir, Milantino Gran Reserva, Anima Gran Reserva e outros insultos ao
consumidor brasileiro, que possa lhe fazer sombra.
As vinhas de “Albarossa”
cobrem 80 hectares e a DOC é produzida por pouco mais de 85 vinícolas.
Pequena, mas promissora DOC piemontesa, o Albarossa
de Enzo Bartoli, me conquistou.
Difícil encontrar, em um vinho, custando pouco mais de 6 Euros,
tanto equilíbrio, maciez aveludada, belo corpo e um logo e prazeroso final.
Para você, que acabou
de pagar insanos R$ 726,30 por um deplorável “Singular Nebbiolo” da Lídio Carraro,
recomendo que em sua próxima viagem pela Itália beba uma garrafa de “Albarossa”
Enzo Bartoli de R$ 36 (6,50 Euros) …Não precisa agradecer a dica
Bacco.