Que o mundo do vinho
é suscetível às modas, é notório.
É notória, também, a
facilidade com a qual as modas são esquecidas e até demonizadas, quando uma
nova tendência marqueteira mais rentável é imposta.
Muitas modas inúteis já foram soterradas, mas algumas,
mesmo ridículas, insistem em permanecer, sobreviver.
Exemplo: Vinho natural.
Não é segredo que o
bom vinho nasce nas vinhas e todos sabem que quanto menos intervenções e
manipulações, na adega, melhor o resultado.
A moda do “vinho natural”, protegida pela sempre poderosa
bandeira “green”, inundou o mercado com um tsunami de inomináveis porcarias.
Na onda do “Vinho Natural” não somos, todavia, obrigados a beber
qualquer porcaria sob a égide do “natural” ou da "tipicidade".
O bom marketing forneceu e continua fornecendo
, argumentos para os eno-asnos que adoram garrafas com insuportáveis “aromas-sabor-cocheiras” e de nauseantes Brettanomyces.
Em 2015, na série "Vinhos
Naturais = Vin de Merde", Bacco tratou do tema e dos absurdos praticados em nome do “natural”.
O acadêmico concluiu
que a análise de vinhas de Merlot, com tratamento biodinâmico, entre 1996 e
2003, não apresentou nenhuma mudança no vinho ali produzido.
Na ocasião metade das vinhas de um vinhedo na Califórnia recebeu os preparados biodinâmicos e a outra metade foi cultivada de
forma convencional.
Quinze anos depois, a história se repete.
No início desse mês, o ótimo blog francês "Les 5 du Vin" ,
publicou as conclusões de um experimento,
conduzido por dois produtores no sul do Rhône, sob a supervisão da Câmara de Agricultura de Vaucluse, sobre o cultivo biodinâmico das
vinhas.
Os dois produtores dividiram as vinhas ao meio
e aplicaram a produção biodinâmica a uma das metades, enquanto a outra foi
cultivada de forma convencional.
Trata-se de um estudo que, embora não seja uma verdade absoluta, tem diversos
fatores que lhe dão confiabilidade:
- foi realizado em Châteauneuf-du-Pape, denominação das mais prestigiosas não
apenas da França, mas do mundo;
- foi realizado ao longo de TRÊS ANOS, para que fosse afastada
qualquer acusação de que as características de um determinado ano poderiam
invalidar os resultados;
- foi conduzido por dois produtores;
- um dos vinhedos, de propriedade do Domaine L'Or de Line, foi
visitado por David Cobbold, do Les
5 du Vin, que constatou que a área era
homogênea em termos geológicos, de altitude e das castas cultivadas.
Foram três comparativos:
- 1º: efeito dos preparados biodinâmicos, sobre a vinha e o solo, para medir os
resultados dessas misturas (chifrestrume, 500, e chifre-sílica, 501) sobre o estado do solo, da saúde da
vinha e de seus comportamentos agronômicos, em comparação a um cultivo
biológico "clássico".
- 2º: efeito dos preparados biodinâmicos sobre a qualidade dos compostos
(adubo, por exemplo), para estimar a contribuição dos biodinâmicos destinados à
compostagem (502 a 507) sobre a qualidade final.
- 3º: avaliação técnico-econômica e organizacional das práticas biodinâmicas,
tratando das implicações financeiras e metodológicas da implantação do
biodinâmico.
O resultado?
Segundo o relatório de síntese do estudo: "Globalmente,
não foi possível, nas condições das provas realizadas, concluir sobre efeitos
[específicos] dos preparados biodinâmicos sobre
o solo, a vinha ou a qualidade dos compostos".
Em seguida, os responsáveis pelo estudo, provavelmente defensores das bruxarias
de Rudolf Steiner, invocam um monte de variáveis – há problemas em tudo, menos na macumba
biodinâmica.
David Cobbold, do “Les
5 du Vin”, resume a situação: "Continuo a pensar que o
biodinâmico, tornado um marketing bastante
eficaz e utilizado, ainda precisa provar sua eficácia agronômica em comparação
a outras práticas que respeitem as plantas e os solos. Os 'pós de pirlimpimpim'
e o jargão que envolve a prática me lembram algum tipo de obscurantismo, e seus
adeptos se recusam a aceitar qualquer abordagem que analise ou critique seus
métodos ou, sobretudo, seus resultados".
Para quem quiser gastar o francês, a matéria está em
Em suma: o biodinâmico não deu em nada com o Merlot na Califórnia e não deu
em nada com as uvas, do Châteauneuf-du-Pape, no Rhône.
Onde ele vai funcionar? No Brasil?
Zé