A matéria de Bonzo despertou interesses e paixões.
A Sicília apaixona os turistas por sua geografia, história,
cultura, gastronomia e …. vinhos.
Vou aproveitar a deixa e comentar uma DOCG da famosa ilha
mediterrânea: “Cerasuolo
di Vittoria”
Minha primeira viagem, naquele incrível museu a céu aberto,
foi nos distantes anos 1990 e resultou em amor à primeira, segunda, terceira,
etc. vista.
Taormina,
Giardini-Naxos, Acireale, Piazza Armerina, Agrigento, Sciacca, Siculiana Marina
(onde comi um dos melhores peixes de minha vida), Ragusa, Troina, Nicosia,
Cammarata, Cefalù…. Em Cefalù começa esta narrativa.
Naqueles anos uma tênue e trémula chama ainda iluminava minha
crença na honestidade, isenção e confiabilidade dos críticos, revistas, pontos,
“bicchieri”, sommeliers, divulgadores etc.
Acreditava que tudo o que escreviam, diziam, pregavam, era uma
verdadeira eno- bíblia e que deveria ser dogmaticamente seguida.
Descobri, a tempo e ainda bem, que não era bem assim: a maior
parte dos julgamentos era descaradamente orientada para resguardar os interesses
de produtores, repleta de grosseiras picaretagens e que visavam apenas enganar
os consumidores.
Já havia enviado, em anos anteriores, uma bela parcela de
famosos produtores do Centro-Norte da Itália à merda e me percebia propenso em repetir
a dose de impropérios e relegar ao mais remoto ostracismo, também, os vinhos do
sul.
A gota d’agua aconteceu na praiana e belíssima Cefalù
Passeando pelas medievais ruelas da cidade, encontrei, quase
escondida, uma pequena enoteca especializa em vinhos regionais.
Sem titubear entrei na pequena loja e depois de rápida
indecisão decidi comprar uma garrafa do então super-badalado “Chardonnay Planeta”.
A “Planeta” era, naqueles anos, uma das mais incensadas
vinícolas da Sicília e seu “olímpico” Chardonnay havia ganho o prêmio da
crítica de então: “Parker”, “Gambero Rosso”, “La Civiltà del Bere”, “Bibenda”
“AIS”, “Decanter”, “James Suckling” e outras alugáveis canetas de vida fácil….
Triunfante, alegre, mas tentando esquecer a cifra gasta na
compra da garrafa (preço de um ótimo Barolo...), voltei ao hotel, deixei o
Chardonnay no frigobar, para refrescar e fui dar um mergulho nas águas límpidas
do mediterrâneo.
Depois banho de mar calculei que o “Planeta Chardonnay” já deveria
estar “no ponto”.
Voltei ao meu quarto, tomei uma bela ducha, escolhi uma taça,
fui até à sacada, sentei na poltrona para admirar o pôr do sol e abri, com todo
cuidado, a garrafa de “Planeta Chardonnay” e......tive uma das
maiores “eno-brochadas” da minha vida.
Um tsunami de manteiga, uma floresta de carvalho, uma usina de
álcool e baunilha saído pelo ladrão, invadiram sem piedade meu nariz paladar e.….carteira.
Cadê a sutil elegância, a proverbial fineza, o soberbo equilíbrio,
o longo final e a incomparável acidez dos grandes Chardonnay?
A Planeta e seus enólogos, que descaradamente apostaram nos
vinhos “parkerianos”, para conquistar o mercado internacional, haviam errado
tudo e seu deplorável Chardonnay lembrava os primos da Côte-D’Or apenas no
preço.
A primeira e abundante taça, já fora suficiente para me
convencer que aquele vinho da “Planeta” nunca mais seduziria meu cartão.
O pôr do sol, o clima mediterrâneo,
a magia de Cefalù, me seduziram e tentei beber mais um copo.
Foi mais um erro: Até os 14,5º de álcool, declarados na
etiqueta, eram falsos e quando levantei percebi meus joelhos levemente trêmulos,
mas minha decisão, de nunca mais comprar uma garrafa da Planeta, foi rígida,
firme e somente quebrada depois de 20 longos anos.
Continua.....
Bacco