Conheci o vitivinicultor, Aurelio Settimo, nos anos 90.
Percorria a bela e tortuosa estrada, que de La Morra desce até
o distrito “L’Annunziata”, para encontrar Massimo Martinelli na sede da Renato
Ratti.
Já havia percorrido, incontáveis vezes, aquele percurso
circundado por esplendidas vinhas e que sempre me emociona.
Uma curva estreita esconde a placa da vinícola Aurelio Settimo,
mas não o suficiente para ignorá-la.
Com um pouco de folga no horário (Martinelli é “britânico”)
resolvi conhecer os vinhos do Settimo.
Sem hora marcada, sem pré-aviso, na maior cara de pau, entrei
no quintal da propriedade, desci do carro e esperei o atendimento que não
demorou nem dois minutos.
O dia era chuvoso e eu sabia que os viticultores não estariam trabalhando,
assim, Aurelio Settimo me atendeu pessoalmente.
Afável, sorridente, olhos vivos, mãos calejadas: Um verdadeiro
homem das vinhas…...e dos vinhos.
Degustamos algumas taças, de garrafas já abertas, conversamos
sobre amenidades e me despedi após comprar 6 Barolo Rocche.
Antes de partir, Aurelio confidenciou: “Consegui um importador e
antes do final do ano meus vinhos estarão no mercado brasileiro.
Parabenizei o viticultor, entrei no carro, agora um pouco mais
pesado e fui almoçar com Martinelli.
Um belo dia, já de volta ao Brasil, encontrei, nas gôndolas do
Carrefour, os vinhos do Aurelio Settimo.
Os preços promocionais, na ocasião, anunciavam o Barolo do Aurelio
Settimo mais barato do que o “Ta-lento-Quase-Parando”
da Salton.
Sem pensar duas vezes comprei algumas garrafas e comentei o
fato em uma mateira no antigo B&B.
Os anos voaram, Aurelio morreu e seus vinhos sumiram das
prateleiras do Carrefour.
A história se repete....
No começo de 2014, percorrendo a mesma estrada, antes de
terminar a mesma curva, um súbito impulso: “Vou comprar algumas garrafas de Barolo do Aurelio Settimo”.
Uma rápida freada, uma endireitada no volante, outra vez sem
agendar, com muita cara de pau, estacionei no quintal da vinícola Aurelio
Settimo.
Ninguém me atendeu.
Uma placa indicava o escritório.
Sem mais delonga e resoluto entrei na sala e perguntei se
alguém poderia me atender.
Olhares desconfiados, interrogativos.
Uma mulher, beirando o cinquenta, levantou de sua cadeira,
veio em minha direção lentamente e sem entusiasmo me guiou até a sala de
degustação.
A desconfiança e a má vontade, da minha acompanhante,
evaporaram quando pedi desculpa e justifiquei o não agendamento da visita
porque havia chegado naquele dia do Brasil (como os italianos sorriem felizes,
quando falo do Brasil. É inacreditável o quanto os italianos adoram o Brasil).
Era uma mentira, mas
colou e Tiziana Settimo, filha de Aurelio, a partir daquele momento me atendeu
como um príncipe....
Tiziana manobrando freneticamente o saca-rolhas, abria garrafas
e mais garrafas, enquanto comentava os vinhos que ia derramando em minha taça.
Em determinado momento,
pensando nas dezenas de curvas que ainda deveria enfrentar, tive que dar um
basta e pedir uma trégua.
Entre um cálice de Barolo e um de Dolcetto relatei à Tiziana
meu encontro com seu falecido pai, falei dos vinhos que havia comprado no
Carrefour e perguntei porque não mais os encontrava no Brasil.
“Vou confessar uma coisa: Cansei de tanta burocracia. O Brasil coloca
dificuldades, exigências e mais exigências. Selos, etiquetas especiais, guias
que nunca acabam..... Cansei! As quantidades exportadas não compensam tanto
trabalho e dor de cabeça. Brasil e México, que é tão complicado quanto,
são mercados que não me interessam mais. É muito melhor, mais fácil e rentável
exportar para os Estados unidos e Canada”.
Com algumas garrafas de Barolo no porta-malas me despedi de Tiziana e com
passos apressados, me esforçando para não perder o equilíbrio e a compostura, entrei
no carro e fui almoçar na vizinha “Osteria Veglio”.
A VINÍCOLA
A história da Aurelio Settimo e parecida com a maior parte das outras de La
Morra e região.
Os pais de Aurelio, em 1943, compraram a propriedade optando pela
produção de frutas, verduras, criar vacas e animais de pequeno porte (galinhas
coelhos, patos...)
Até os anos 50 as uvas produzidas eram vendidas aos grandes produtores da região e apenas
uma pequena parte era vinificada para o uso familiar, parentes e amigos.
Com a morte do pai, Domenico, em 1962, Aurelio, acreditando no
enorme potencial vinícola de suas terras, abandonou a criação de animais, aumentou
a área de cultivo das parreiras e resolveu se especializar na vitivinicultura.
Nascia, em 1962, a vinícola “AURELIO
SETTIMO”.
As dificuldades iniciais não foram pequenas e nem poucas: Até
1974 somente 50% das uvas eram vinificadas e a outra metade continuava sendo
entregue às grandes vinícolas da região.
A partir de 1974 todas as uvas produzidas passaram a ser
vinificadas na propriedade.
Nos pouco mais de 6 hectares, da Aurelio Settimo, somente uvas
tintas: Dolcetto e Nebbiolo,
Os vinhos: Dolcetto D’Alba,
Langhe Nebbiolo, Barolo
e um interessante Rosé.
O BAROLO ROCCHE DELL’ANNUNZIATA
Os Barolo, provenientes das colinas de La Morra, são considerados,
por muitos, os mais “femininos” de todos.
Preconceito bobo e inconsistente.
O “Barolo Rocche dell’Annunziata 2008”, da Aurelio Settimo é prova viva do contrário.
Com sua límpida cor grená, seu aroma intenso, elegante e que
lembra flores (violetas em particular), seus taninos presentes, mas não
agressivos e a longa permanência na boca, o Rocche dell’Annunziata é um
daqueles vinhos que se fazem beber facilmente e que doam uma grande satisfação
àqueles que sabem apreciar grandes vinhos.
Pouco mais de 6.000 garrafas do Barolo
Rocche dell’Annunziata, produzidas respeitando fielmente a
tradição, são comercializadas anualmente.
O preço?
Acompanhei a polemica provocada pelas duas últimas matérias do
Dionísio e me sinto quase constrangido em revelar, que um vinho tão complexo,
equilibrado e importante, como o Barolo Rocche
dell’Annunziata 2008 me
custou 28 Euros (R$
84)
Bacco.
PS. Recados aos
eno-patriotas: Se o Merlot da Aurora foi considerado (sabe-se lá por quem) um
dos melhores 100 vinhos do mundo, só me resta concluir uma coisa:
O Barolo da Aurelio Settimo pertence a um
outro mundo; o mundo dos críticos sérios.
Mais um excelente artigo, Bacco. Que pena que este vinho não vem mais para o Brasil, por culpa desta enorme e eterna "Burrocracia".
ResponderExcluirO pior é que tem gente que acredita que vinhos brasileiros conseguem superar um vinho deste.
Salu2
Pois é....Uma pena.
ExcluirParece haver uma equipe , comandada pelos produtores nacionais , para divulgar balelas que são consideradas verdadeiras por uma legião de paspalhos
eu conheço um cara (primo bem mais velho) que ha anus fala que o carrefour sempre tem coisas boas por bons precos. esse cara deve ser centenario como bacco, pois me diz que vem da epoca que barolo no bananal custava $ 20.00.
ResponderExcluirDificil crer que esse vinho bom ja esteve a esse preço, mesmo na epoca do guarana jesus de rolha.
PS: Meu primo tem mais de 14 anos de experiencia com vinho e nao toma vinho nacional. RAAA!!!!
Horário Defasado, não sou centenário ,mas beirando....O Carrefour ,quando entrou de sola nos vinhos (há 20 anos) mantinhas em sua prateleiras Barolo, Chateauneuf du Pape, Barbaresco, Amarone, Chablis, Tapada do Chave, Pera Manca e uma infinidade de outras grandes etiquetas. Uma vez, ou duas, por ano realizava liquidações com preços de matar de raiva nossos produtores que não vendiam uma gota sequer nem de Chalise.. O tempo passou e o Carrefour .....Bem o Carrefour não é mais o mesmo.
ResponderExcluirHá vinte anos atrás (sic), quando eu ainda morava em São Paulo, costumava ir ao Carrefurto comprar vinhos. Era só ficar de butuca nas promoções para pegar coisa boa e a bom preço. Mas como você diz, o Carrefurto já não é mais o mesmo. E minha cidade não possui um...
ExcluirAté eu peguei um pouco dessas promoções do Carrefour. Quando comecei a trabalhar, há 20 anos, já me interessava por vinhos, e ficava passando nos supermercados pra pegar promoções. O Carrefour fez uma queima incrível, tinha vários champagnes, portugueses (comprei Tapada do Chaves), wiskhy 15 anos, etc. Peguei o que podia. Quando estava lá quem eu vejo com o carrinho cheio de champanhe e outros vinhos? O dono do restaurante Francisco, que certamente iria revende-los por 4x o preço.
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