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quinta-feira, 28 de dezembro de 2017

VIVA OS CAMIONEIROS


 

Todos os consumidores, que entram no mundo do vinho, iniciam sua jornada sempre através de uma visão idílica, poética e romântica.

Cachos pisados na cantina, fermentado com a supervisão de um velhinho simpático, passagens por tonéis, barricas, garrafas e finalmente á nossas taças.
 

 

“Veja que delicioso esse Tempranillo espanhol”

“Que maravilha esse Barbera italiano”

 “Que delícia de Cabernet chileno”.

São frases elogiosas e declaradas para todos os vinhos do mundo...

Certa feita um amigo meu, ao degustar um vinho americano, revelou que sentia o aroma do solo da Califórnia.
 
 

Um belo dia, sem ter nada melhor para fazer, fui passear e perder meu tempo perto da fronteira do Chile e Argentina na província de Mendoza.

 O número de caminhões, trafegando de lado para outro, já deveria ter sido alvo de documentário digno de Oscar.

 Ou um prêmio qualquer, tipo "Capivara de Ouro" ou algo assim, do cinema nacional.
 

Proponho Sonia Braga, toda empoderada, no papel principal e dirigindo um caminhão, cheio de vinho, do Maule até Valparaiso.

 De lá, o vinho, segue até a Espanha onde, milagrosamente, se transforma em um vinho puro sangue espanhol e reenviado para todos os lugares do mundo....

Nos USA, durante a entressafra do leite, os mesmos caminhões que carregam o produto das vacas, são largamente usados para transportar o vinho (capitalismo.... viva a economia de escala!).

Grandes vinícolas estão ganhando fortunas abastecendo indústrias menores com containeres repletos de vinhos

A vinícola menor, sem capacidade de aumentar a produção, compra vinho de outra, coloca seu rótulo nas garrafas e sai vendendo vinho, "batizado", pelo mundo.... exclusividade tem, agora, mais uma definição.

Digamos que dói saber que 25% dos vinhos do mundo são transportados em caminhões-tanques para cima e para baixo.

Alguém já percebeu que, em muitos lugares do mundo, os vinhos com denominação geográfica não muito rígida, mas declarada na etiqueta, nada tem a ver com seriedade?
 
 

 O que acontece?

 Muitas vezes é possível apresentar o vinho de "origem garantida" desde que a percentagem (hipoteticamente 75%, um pouco mais, um pouco menos) seja realmente de uma variedade cultivada na região.

 O que acontece com outros 25% é mágica pura e...... containers?

O mercado de vinhos em container (bulk in english) apresenta, atualmente, crescimento vigoroso.

 BEM VIGOROSO: São quase 7 anos de crescimento tipo chinês.

Motivos há muitos.

Vejamos alguns:

Crescimento de "private labels" por parte de hotéis, restaurantes, importadores e distribuidores.

Cidadão entra numa churrascaria, de uma rede qualquer, e pede o vinho da casa.

Alguém acha que um famoso Chateau de Bordeaux destinou parte da produção com nome milenar deles para atender a esse novo cliente?

acorda!!!!!!

Encomenda e compra vinho do Chile, da Austrália, faz um blend qualquer e põe o rótulo que o cliente inventou.
 
 

È possível, todavia, explicar o vigoroso aumento do comércio (e dos preços) de vinhos em containers: quedas de produtividade no Chile, Argentina, Espanha, Itália e até na Califórnia, por conta do querido clima.

Por essas e por outras, que estou sem paciência para gastar dinheiro com vinho do novo mundo.

 Espero que você tenha entendido: Toda vez que receber um e-mail com desconto de 80% (EU QUERO!!) no vinho italiano, francês, espanhol etc. há uma chance enorme de o seu vinho ter sotaque argelino, chileno, australiano...
 

Não configura crime vender vinho produzido por outros portando minha etiqueta, mas soa, no mínimo, como desconfortável omissão dos fatos...... Mais uma vez.

Em tempo: o mercado de azeite padece dos mesmos males e comportamentos.

Bonzo

sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

DUE BUOI



 


O pagamento, de duas multas de trânsito, me "obrigaram" a conhecer Alessandria.

Contrariando meu ateísmo, rezei aos céus para que nunca mais cometa uma infração naquela província piemontesa: Alessandria é muito feia.

O único lugar interessante, da cidade, é a enorme praça e os imponentes pórticos que a contornam.

A praça, melhor dizendo, "era bela"

 
Um prefeito, que deve ter frequentado a mesma escola do Roriz, a transformou em um imenso estacionamento asfaltado.

Paguei as multas e, antes de retornar a Santa Margherita, resolvi almoçar no melhor restaurante da cidade: O estrelado "I Due Buoi" (Os Dois Bois).

O "I Due Buoi", fundado no século XVIII e estrelado desde 2015, no almoço serve um menu, menos complexo e mais leve que o jantar, por um preço bem razoável: 30 Euros.
 

Um antepasto, um primeiro prato, um segundo e o dessert, propostos, pelo chefe japonês, são refinados e de altíssima qualidade.

Vale à pena conhecer o "I Due Buoi".
 

O maitre, que devia ter algumas garrafas encalhadas e me achou com cara de jacu, resolveu testar minha paciência.

Conseguiu.......

"Um aperitivo?"

Anui.

 O maitre deu as ordens e o sommelier, sem muita cerimônia, me serviu um Prosecco.

Nada contra o Prosecco, que vende feito água em todos os cantos do planeta, mas nem em boteco e sob tortura, eu bebo Prosecco.

Havia sido estuprado pela prefeitura de Alessandria e não encontrei forças para mais uma briga.

Engoli o Prosecco e ordenei um vinho branco "fermo".

O sommelier, já convencido que eu poderia beber qualquer coisa sem reclamar, me serviu um "Chardonnay Berrò" da vinícola piemontesa Pico Maccario.
 

Aquele, certamente, era o dia que me fora reservado, pelo acaso, para testar a resistência e elasticidade de meu saco.

Conheço, suficientemente bem, os Chardonnay da Bota e os considero , assim como todos os outros de outros cantos da Europa , ridículas imitações dos verdadeiros e ótimos Chardonnay franceses.

O Piemonte, pátria de grandes tintos e de alguns bons brancos autóctones, teima em produzir Chardonnay deploráveis.

Eu nunca entendi para quem e para que.
 

As terras reservadas ao plantio do Chardonnay sempre são aquelas menos indicadas ou impróprias para o cultivo das castas regionais mais conhecidas e importantes (Nebbiolo, Barbera, Dolcetto, Moscato etc.), consequentemente, os Chardonnay piemonteses "fanno cagare".

Aquele "Chardonnay Berrò" da Pico Maccario, foi, sem sobra de duvida, o pior que bebi nos últimos anos..... Uma tremenda bosta.

Uma comida ótima acompanhada por vinhos horríveis
 

O saco já estava cheio, quase estourando.

Chamei o maitre e sem cerimônia alguma, fui logo dizendo: "Erro número 1: Restaurante estrelado serve ao cliente Prosecco como aperitivo. Erro número 2: Na "pátria" do Timorasso o sommelier serve um Chardonnay de merda. Erro número 3: O maitre subestima grosseiramente o cliente. Erros enumerados..... Agora, por favor, me sirva um vinho decente".

O maitre, com cara de quem assistira um discurso da Dilma, saiu quase correndo e voltou com uma garrafa de Timorasso Pitasso de Claudio Mariotto.

Grande vinho (que não foi cobrado) selou a paz entre o sommelier o maitre e eu.
 

Recomendo, com entusiasmo, o "Due Buoi"

O "Due Buoi" vale o "castigo" de conhecer Alessandria e beber o Chardonnay do Pico Maccario.

Esta matéria é a última antes do Natal.
 

Voltarei, dia 27, para comentar todos os "Segundos Chardonnay do Mundo".

A idéia dos "segundos" surgiu ao lembrar aquela imbecilidade, inventadas pelos produtores gaúchos, sobre os espumantes brasileiros.
 

Aguardem.   

Bacco

terça-feira, 19 de dezembro de 2017

TERROR E TERROIR



Ao retornar, para casa, notei que havia várias mensagens na secretária eletrônica.
 
 
 

Alguma coisa me dizia que eram dirigidos ao malfadado artigo sobre fermentação e teor alcoólico que escrevera para B&B.

Bola preta na caçapa.

Uma onda de escárnio e desprezo, vinda do populacho, se aproximou com mais velocidade do que gaúcho passando cheque do Bradesco na BR 163.

Mensagens escutadas, choro no chuveiro, lições aprendidas.
 

Pensei que seria melhor nem comentar o ótimo livro do Mark Matthews sobre os mitos da viticultura e enologia.

 Afinal M. Matthews fala sobre vários tópicos que encantam muitas pessoas no mundo e garantem muitos empregos, mas, que no final da feira, tem peso menor na qualidade final do vinho.

Se pudesse falaria sobre um assunto que ele enfatiza e atraiu (e ainda atrai) muito debate no lançamento do livro: TERROIR

 Matthews passou anos e anos pesquisando e ensinando para oferecer a visão de que "terroir" é algo usado e abusado (e vago) em detrimento de duas coisas muito importantes na obtenção de um vinho de alta qualidade: Variedades de uvas, que passam as respectivas características ao vinho e o processo/método de vinificação.
 

Em um capítulo sobre solo há mais: Quanto e quando de água para as videiras, densidade do plantio, densidade das bagas, área foliar, exposição solar, composição e estrutura do solo etc.

Infelizmente não poderei compartilhar as sábias palavras do professor.

O livro me fez pensar o quanto, em algumas áreas do mundo, se adora falar somente de terroir, terroir, terroir e mais nada, como se terroir fosse fator único e determinante para produto.

Seria para efeito de valorização da área ou da natureza?

Ainda mais fascinante foi a descoberta do que significava o termo "terroir", originalmente, lá atrás.

Seria uma surpresa e tanto para muitos saberem que nunca foi algo, somente, positivo.

 Mas isso ficará sem resposta.

Pensar que, segundo Matthews, terroir, há muitos anos, tinha conotação de estrume na avaliação dos vinhos daquelas eras.

A quem interessaria os discursos, quase folclóricos, que cercam o mundo do vinho?
 

 Parece que muitos viventes possuem uma imperiosa necessidade de sempre adicionar algo holístico em qualquer assunto ainda não resolvido ou comprovado.

Pouco a pouco os mitos da enologia estão sendo derrubados.

 Acho, por exemplo, que a ala que defende ser o solo aquele que confere aroma e gosto aos vinhos está condenada.

 Sorte de quem tem lotes especiais no RGS e azar dos produtores de Champagne?
 

Aguardaria com entusiasmo a chuva de pesquisas e trabalhos feitos pela brava gente sobre o conceito de terroir gaúcho, terra mágica que produz alguns dos melhores espumantes do mundo.

Se fosse para compartilhar isso, aqui estaria o link do livro

 

 

 

 

 

sexta-feira, 15 de dezembro de 2017

O VÔO DO BAROLO



Se tivesse que escolher uma canção, para lembrar o desempenho do Barolo, em 2017, minha escolha seria esta
 
 
 
 
 

O grande vinho piemontês, literalmente, alcançou a lua.

Mesmo após de seis anos, de crescimento positivo, o Barolo, em 2017, conseguiu aumentar as vendas em mais 7%%.

 Os estoques, nas adegas, são quase inexistentes, as uvas Nebbiolo da Barolo foram vendidas por 5 Euros o kg e as garrafas, do prestigioso vinho, voaram e se espalharam para todos os cantos do planeta.

É o paraíso do vinho e das vinhas.
 

Será?

Não!

O sucesso traz consigo, quase sempre, a ganância.

Para 2018 o consórcio do Barolo recebeu nada menos do que 437 pedidos para a implantação de "Nebbiolo da Barolo" para um total de 127 hectares de novas vinhas.

Alguns números: São 14 milhões as garrafas de Barolo produzidas nos 2112 hectares da DOCG
 

127 hectares representariam um aumento de 6% na superfície cultivada e um acréscimo de 840 mil garrafas no já "inchado" mercado.

O sucesso do Barolo foi impressionante e em menos de 40 anos a produção passou de 3,5 para os atuais 14 milhões de garrafas.

O mercado pede números maiores, mas será que o aumento da produção não diminuirá a qualidade?

Muitos produtores acham que sim.

O pensamento dos tradicionalistas poderia ser resumido nas palavras de Maria Teresa Mascarello da Vinícola Bartolo Mascarello: "Um bem é precioso quando é raro. Se continuamos a aumentar a produção, o Barolo poderá se transformar, em breve, em um novo Prosecco".
 

Sábias palavras: Já ha muito Barolo porcaria no mercado.

Eu acredito que os 2112 hectares sejam mais que suficientes.

Bacco

 

 

quarta-feira, 13 de dezembro de 2017

HISTÓRIAS - ORNELLAIA



 


Desejava, há algum tempo, escrever passagens, engraçadas ou interessantes, de minhas viagens pelos territórios das vinhas e dos vinhos.
 
 
 
 

 "O Primeiro Ornellaia a Gente Nunca Esquece" é a matéria que inaugura uma série que apresentarei, mensalmente, no blog.

Boa leitura

"O PRIMEIRO ORNELLAIA A GENTE NUNCA ESQUECE"

Era o início dos anos 2000.

Já havia percorrido várias regiões vinícolas, mas ainda não "dominava" as vinhas da Maremma e seus famosos "Supertuscans".
 
 

Piemonte, Lombardia, Toscana, Veneto, Friuli- Venezia Giulia, Tentino- Alto Adige, Liguria, Emilia Romagna, Umbria, Toscana, Marche, Abruzzo, regiões que percorrera diversas vezes, já não tinham mais mistérios, mas a Maremma era, ainda, uma ilustre desconhecida.

Quem acredita que passear, por exemplo, por Alba e região já é suficiente para ser considerado "doutor" em Piemonte, precisa botar as barbas de molho e entender que cada região italiana é composta por muitas e importantes sub-regiões.

Exemplos.

Piemonte: Langhe, Astigiano, Basso Monferrato, Alto Monferrato, Roero, Alto Piemonte etc.

Veneto: Valpolicella, Colli Euganei, Conegliano- Valdobbiadene (Prosecco) etc.

Toscana: Chianti, Chianti Classico, Montalcino, Montepulciano, Bolgheri..... Pois é, faltava Bolgheri.
 

A meteorologia previa uma semana de frio, chuva e neve em Bolgheri e toda a Maremma.

Ótimo!

Nada melhor do que chuva, frio e neve para espantar as multidões de turistas e percorrer, tranquilamente, territórios badalados.

Além de conhecer Bolgheri, seus caríssimos e premiados vinhos, outro endereço aguçava minha curiosidade e estava em minha mira: "Gambero Rosso".
 

"Gambero Rosso", para quem não sabe , foi considerado e aclamado, durante longos anos, o melhor restaurante da Itália (muitos o consideram o melhor de sempre).

O "Gambero Rosso" nasceu e morreu em uma casa, sem charme algum, no porto de San Vincenzo.

San Vincenzo, cidade esquálida e sem graça, sobrevive e bem, por três razões: O porto, lotado de barcos de luxo, a praia de areias finas e a gastronomia.


Além do "Gambero Rosso" havia e há, em San Vincenzo, uma meia dúzia de ótimos endereços eno-gastronômicos (Zanzibar em primeiro lugar...)

"Boa tarde. É possível reservar uma mesa para um?"

Normalmente a resposta seria negativa, mas a neve e o frio haviam afugentado todos os clientes e...... Sim,  a mesa para o jantar estava confirmada.

Pontualmente, às oito horas e diante dos olhares incrédulos dos cozinheiros, entrei na cozinha do "Gambero Rosso".

 

Fulvio Pierangelini, chef e proprietário do restaurante, do alto de seus 1,90, me olhou como se eu fosse um ET e me fulminou com o olhar

"A entrada do restaurante é pelo porto".

Antes que uma panela me atingisse pedi desculpas, pelo ato falho e me dirigi para o ingresso indicado

O "Gambero Rosso" era diferente até no acesso: A porta da cozinha dava diretamente para calçada da rua principal e o ingresso do restaurante se escondia no passeio do porto.

 

Resolvido o impasse fui recebido com classe e gentileza na pequena e elegante sala daquela catedral gastronômica.

Apenas dois casais ocupavam outras mesas além daquela que me fora reservada.

Observador, notei que o casal, da mesa no canto da sala, não parecia ser exatamente, apreciador da refinada culinária do "Gambero Rosso".....

Percebi que o homem, de meia idade, com uma arroba de gordura em excesso, careca, espalhafatoso e falante, tentava impressionar e conquistar uma loira (russa?), um palmo mais alta e 35 anos mais nova.

 

Não precisei me esforçar para ouvir o Casanova ordenar, ao sommelier da casa, um "Ornellaia".

Consultei a carta de vinhos, que o sommelier deixara em minha mesa e verifiquei que nosso rotundo conquistador não queria economizar: Ornellaia=270 Euros.

O sommelier anotou o pedido, trocou as taças por outras maiores e mais importantes, foi até a adega e retornou, triunfante, trazendo a garrafa de 270 Euros.

Com toda a pompa e cuidado, que uma etiqueta repleta de Euros exige , abriu a garrafa , provou , aprovou o vinho e sorridente serviu o Casanova esperando seu veredicto.

 

"Não está bom!"

O sorriso desapareceu da face do sommelier e o profissional ficou petrificado quando nosso conquistador esbravejou: "Espero que a próxima seja uma garrafa perfeita".

Quase correndo e tropeçando, o rapaz voltou à adega e poucos minutos depois retornou com uma nova garrafa de "Ornellaia"

Mesmo ritual, mesmo cuidado e...... "Será possível que você não consegue encontrar uma garrafa, decente, na adega".

 

O sommelier, lívido e com os olhos quase saindo das orbitas , saiu da sala, literalmente, correndo.

Minutos depois os abundantes cachos e os 1,90 metros de Fulvio Pietrangelini, carregando as duas garrafas de "Ornellaia", se aproximaram da mesa do Casanova.

"As duas garrafas estão perfeitas, o senhor não entende merda nenhuma de vinho e está querendo apenas aparecer. O melhor e desaparecer, agora, antes que eu me zangue. Levante e saia do meu restaurante".

 

Sem protesto, sem resposta, calado, o casal vestiu os capotes e sumiu na noite gelada.

Pietrangelini parou bem à minha frente e com olhar, ainda, ameaçador perguntou; "O senhor gosta de "Ornellaia"?

Respondi afirmativamente (não tive coragem de declarar a minha preferência pelo Brunello).

O cozinheiro gigante deixou a garrafa na minha mesa e exclamou: "Então beba, o quanto quiser, por minha conta".

 

Graças a um ridículo Casanova, naquela noite, a ótima cozinha do Gambero Rosso foi regada com o caríssimo Ornellaia.

Continua

Bacco

segunda-feira, 11 de dezembro de 2017

ADEUS DELICADEZA?


 


Durante um bom tempo a indústria vinícola produziu vinhos, brancos ou tintos, que não superavam os 12% de álcool
 
 

Com o aquecimento do planeta e o aumento da produção, em regiões mais quentes, foi dada a partida para a moda dos vinhos pesados e super alcoólicos.

 Depois de algum tempo as vinícolas perceberam que boa fatia dos consumidores havia apreciado a novidade e induziram as uvas a produzir mais açúcar, ainda nas bagas, ou então adicionar açúcar ao mosto.

Mais goró por menos $$, era o novo milagre da multiplicação.

Tomar meia garrafa e cair de bêbado no sofá.
 
 

Parecia um ótimo negócio.

Vamos à química básica e mostrar porque essa onda, de vinhos ultra-alcoolicos, é ruim à saúde e à qualidade dos vinhos:

1) Durante a fermentação são formados vários compostos de álcool. O mais predominante é o nosso querido etanol, mas antes dele e depois dele, há moléculas menores e maiores ambas com pontos de evaporação diferentes. Temos a produção de alcoóis tóxicos e agressivos, aos sentidos, nas duas pontas da cadeia.

2) Alcoóis reagem com ácidos presentes no vinho e, de maneira bem aleatória, produzem esters. Esses são os componentes que dão os aromas maravilhosos de frutas e outras coisas mais, mas não sempre: às vezes, os aromas, são desagradáveis. Quando os vinhos envelhecem, dependendo dos alcoóis e ácidos presentes, evoluem bem..... ou não.

 

Quanto maior a presença de álcool no vinho, após a fermentação, mais problemas: alcoóis ruins em maior quantidade (os que dão aquela dor de cabeça), formação de compostos aromáticos, também em maior quantidade e de forma imprevisível e com boa chance de serem off-character, inclusive durante a evolução do vinho e ao longo dos anos, na garrafa.

Como não há como jogar sucrose fora da uva (o açúcar das uvas), as vinícolas, agora, perceberam que precisam fazer algo.
 

Estão diluindo o mosto em mais (pleonasmo?) água (aumenta o volume em tese aumenta o faturamento), conduzindo osmose reversa para diminuir o álcool (houve um belo embate entre produtores franceses e autoridades inglesas que bloquearam a venda de vinhos que passaram por essa destilação fracionada, mas agora já resolveram o impasse).

 Ambas as técnicas retiram, também, coisas boas dos vinhos.

No final das contas essa onda de vinhos super alcoólicos acabou sendo ruim para todos.

Na próxima ressaca pense na quantidade de lixo que está tomando......

Barato sai caro...

Se, realmente, o clima aquecer, ainda mais, acostume-se com uma nova geração de vinhos bem menos complexos, bem menos aromáticos e é bom lembrar que muitas uvas também não suportarão um clima tão agressivo.

 Adeus à delicadeza das Pinot e brancos delicados.

 Estamos falando de algo para as próximas décadas, mas já aprendemos que os próximos 20 anos estão ali na esquina.

Bonzo