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segunda-feira, 31 de outubro de 2016

O PIOR RESTAURANTE



 

Folheando a publicação da 86ª Fiera del Tarufo Bianco D'Alba descobri um novo nome na vasta galeria de restaurantes "Top" da região.

Os organizadores indicavam o "Matteo Morra Restaurant", como um endereço válido para se apreciar receitas elaboradas com o "Tartufo Bianco" e pratos da rica gastronomia regional.

O novo endereço aparecia ao lado de pesos pesados das panelas piemontesas: "La Ciau del Tornavento", "La Rei", "Castello di Grinzane", "Locanda del Pilone"........

O nome, fácil, ficou gravado em minha memória.
 

Semana passada, dirigindo pela estrada, que de Barolo serpenteia por entre as vinhas até La Morra, ao enfrentar uma das dezenas de curvas, dei de cara com uma grande placa que anunciava o "Matteo Morra Restaurant".

Localizado no meio das vinhas, da antiga vinícola "Sylla Sebaste", o restaurante chamou minha atenção pela belíssima e panorâmica posição.

Em La Morra, enquanto bebericava uma taça de Timorasso, na ótima enoteca "Le Vigne Bio", resolvi telefonar para o "Matteo Morra Restaurant" e reservar uma mesa.

"Sem problema, mas abrimos somente às 12,45".
 

Sem problemas para mim, também, que me sacrificaria e tomaria não apenas uma, mas duas taças de Timorasso.

Às 13 horas, em ponto, estacionava o carro ao lado das vinhas de Nebbiolo que cercam o restaurante.

"Pode escolher a mesa....Hoje há poucas reservas".

Na realidade não havia outra além da minha e, mais uma vez, enfrentei a angustiante sensação de estar atrapalhando o descanso do cozinheiro e do garçom.
 

"Algum branco em taça como aperitivo?"

O garçom solícito, vestindo um paletó e calçando sapatos que clamavam por uma aposentadoria por tempo de serviço, me ofereceu um cálice de Chardonnay "Lidia" da vinícola La Spinetta.

Eu sempre achei os vinhos da "La Spinetta" tão elegantes quanto o rinoceronte que aparece em todas as etiquetas de suas garrafas.

 O Chardonnay "Lidia" não foge à regra e exibe a leveza e a classe de um rinoceronte......
 

Impossível beber mais que uma taça do Chardonnay Lidia que, até no preço, 40/45 Euros, é exagerado.

O silêncio quase monástico, do "Matteo Morra Restaurant" e o peso do Chardonnay "Lidia" me fizeram acelerar o almoço e pedir, sem mais delongas, os pratos.

Escolhi, como antepasto, "Vellutata di Zucca e Porri con Amaretti" (Creme de Abóbora e Alho Poró com Amaretti) e "Capretto con Riduzione di Barbera" (Cabrito com Redução de Vinho Barbera) como prato principal.
 
Querendo fugir do rinoceronte e dos vinhos da La Spinetta, já pensando no cabrito, ordenei uma taça de Barbera sem terminar o ”Chardonnay "peso pesado" Lidia.

O garçom abriu uma garrafa de Barbera e, enquanto servia o vinho, elogiava, com entusiasmo, o produtor.

A idade me transformou em um homem menos paciente e mais ousado.
 

 Ao cheirar o Barbera, indaguei: "O viticultor vinificou este Barbera num estábulo? O vinho está com cheiro de estrume".

O garçom, estupefato balbuciou algumas palavras, recolheu a taça e abriu, imediatamente, outra garrafa.

Com olhar desconfiado e quase com medo, comentou "Esta Barbera é uma Barbera simples e de nossa produção".

Simples, sem cheiro de bosta de vaca, a Barbera era bebível e agradeci.
 

A "Vellutata de Zucca e Porri", comum, meio aguada, não convenceu e confesso que, sem muito esforço, eu faço melhor.

O cabrito me surpreendeu!

Já no primeiro pedaço percebi que aquele almoço seria inesquecível, mesmo.

Tentei comer mais um pedaço, mas não deu...... Desisti.
 

Chamei o garçom que fugira logo após servir o prato e indaguei "Esse cabrito foi criado em uma salina? É impossível comer... Há sal demais".

O pobre rapaz tentou inutilmente culpar a redução da Barbera, mas ao ver minha cara, de búfalo enfurecido, desistiu e fugiu definitivamente.

Voltou quando pedi a conta que, tão salgada quanto o cabrito, motivou esta matéria.
 

O cozinheiro do "Matteo Morra Restaurant" é tão bisonho que parece ter frequentado o Iesb ou Unieuro de Brasília.

O "Matteo Morra Restaurant" foi, sem dúvida, o pior restaurante que encontrei nos meus longos anos de Langhe e não acredito que continue aberto por muito tempo.
 

Fuja!!!!!

Bacco.

segunda-feira, 24 de outubro de 2016

CHAMPAGNE RIVE GAUCHE


Mês passado, um amigo, em viagem turística pela Champagne, me pediu algumas indicações de pequenos produtores daquela região.

Dei algumas dicas de válidos "vignerons" que eu aprecio.

Entre eles indiquei o Champagne "Bérêche Brut Réserve", da vinícola homônima.    

Semana passada, procurando uma chave de fenda, no quarto da bagunça, encontrei, além da ferramenta, uma garrafa de Champagne com a etiqueta envelhecida e manchada.
 

Uma rápida olhada e percebi que se tratava de um "Rive Gauche" da Bérêche & Fils que o meu amigo Paulo Cogorno havia sugerido para que eu comprasse.

"É um Champagne incrível, vinificado com uvas Meunier em pureza. Vou adicionar pelo menos uma garrafa ao seu pedido".

O preço, um pouco mais caro que o Bérêche Brut Reserve, não me animou a autorizar mais de uma garrafa.
 

A má conservação da etiqueta me impressionou e resolvi provar o vinho antes de sua possível "morte".

A morte, daquela garrafa, estava mais longe do que a minha......

Perfeito e impressionante...... Um grande Champagne que bota no bolso muitas garrafas caríssimas e badaladas.
 
 

A intensa cor dourada revelava a casta.

Os aromas complexos me lembraram frutas cítricas (muitos outros, não consegui identificar).

Na boca a grande surpresa.

Seco, sem a incomoda presença das leveduras em excesso, final longo e um convite a beber sempre mais uma taça.

O "Rive Gauche" é um Extra Brut (3g) que não cansa e convida o apreciador a explorar, mais e mais, seus "mistérios" (aromas e sabores).

As 3.000 garrafas de "Rive Gauche" pruduzidas pela Bérêche & Fils não são fáceis de encontrar, mas recomendo, com entusiasmo, que o amante de Champagne perca um pouco de tempo à sua procura.
 

Mais uma coisa: O "Rive Gauche" é vinificado com uvas proveniente de vinhas com mais de 40 anos, permanece 32 meses sobre leveduras e custa 42/48 Euros.

Para beber uma garrafa de "Miolo Brut Millesime" o enófilo brasileiro deverá desembolsar R$ 205,00.
 
 

Se alguém disser: "mas os impostos no Brasil....." vou mandá-lo...

Bacco

quarta-feira, 19 de outubro de 2016

DEPOIS DA ESBÓRNIA



O filho Vittore e o irmão Alessandro, assumindo a vinificação e comercialização, liberaram Gian Alessandria para o trabalho "apenas" nas vinhas.

As tarefas para a manutenção das videiras são muitas, trabalhosas, nada fáceis e exigem experiência e cuidados especiais.
 

A cada safra há, no mínimo, 12 intervenções nos parreirais.

A poda invernal é o primeiro trabalho depois da vindima. No verão é preciso efetuar a poda verde e entre estas duas operações, e a cada mês, há outras tarefas importantes: a curvatura e amarração dos ramos, replantio de parreiras mortas, aração para aerar o terreno, troca de paus de sustentação apodrecidos, pulverização contra oídio e peronóspora etc. etc. etc.
 

Gian, experiente e competente viticultor, tira de letra todas as tarefas do campo e goza, atualmente, de bastante tempo livre.

Tempo livre, em Verduno, aldeia de pouco mais de 500 moradores, pode significar tédio mortal, especialmente, no inverno quando escurece às 17 horas.
 

Na primavera e verão há enófilos, turistas, compradores...... um pouco de movimento.

No inverno é tamanha tristeza que quase beira a depressão.

Quem não tiver um hobby, não puder viajar ou ter uma atividade qualquer,  morre de tédio

Gian, sempre ligado ao território, encontrou seu hobby, sua nova paixão: Trufas!
 

Comprou dois cachorros semi adestrados, aperfeiçoou ambos e quase todos os dias, dedica seu tempo livre à procura das trufas.

Após a "esbórnia", lá fomos nós!

"Está muito seco, não choveu e não vamos achar trufas brancas. Acho que somente encontraremos as negras"

Depois de proferir as proféticas palavras, Gian Alessandria, prendeu seu dois cachorros, um macho e uma fêmea, na trazeira do carro e fomos até os bosques de Verduno.

 
Ao chegar à área escolhida, Gian abriu a porta trazeira e soltou os animais.

A alegria dos cães, ao se verem livres, foi imensa e Gian teve que usar de toda sua autoridade para conter a debandada.

Um pedaço de salsicha e algumas imprecações foram suficientes para acalmar nossos parceiros. 
 

Se alguém acha que os cachorros de trufas são de uma raça especial, está redondamente enganado: são vira-latas treinados para procurar e encontrar o precioso cogumelo.

A cadela malhada, mais ativa, encontrou a maior quantidade, naquele dia, mas o macho achou as trufas maiores.
 

Os cães farejam percorrendo o terreno em várias direções quase com sofreguidão e quando encontram a trufa começam a cavar.

O "trifolau" dá uma ordem de espera, se aproxima e, com um ferrinho, extrai a trufa do solo.
 

A recompensa, para o cão, é um pedaço de salsicha, ou qualquer outro petisco, para cada trufa descoberta.

As trufas encontradas, naquela tarde, foram de pequeno calibre e a foto, com a presença de uma tampa de garrafa de água mineral, dá uma exata proporção do tamanho.
 

É preciso salientar que a trufa negra é muito, mas muito menos aromática que sua rara e cara prima branca.

O aroma da trufa branca é inumeras vezes mais intenso e pode ser identificado muito mais facilmente.
 

 Causa espanto, então, a facilidade com que o cão consegue farejar uma trufa negra, pouco maior do que uma ervilha, coberta por dois ou três centímetros de terra.

Eu tive que colocar aquela pequena trufa quase no nariz para perceber seu cheiro.
 

Havíamos planejado de jantar no "Arco dei Nobili" em Perno, mas depois de quase duas horas de subidas e descidas, acompanhando os cachorros, Gian e eu nos olhamos e, quase ao mesmo tempo, dissemos: "Fica pra outro dia..... Estamos mortos"

Até a próxima, Gian.......

Bacco.

 

 

 

segunda-feira, 17 de outubro de 2016

A ESBÓRNIA



O almoço foi longo e a quantidade de vinhos excessiva.

Gianni Cauda, chef do "Dai Bercau", em dia de rara inspiração, resolveu, nos brindar com um prato único realizado com cogumelos fresco: "Fungo con Uovo", "Funghi Trifolati" e "Funghi Fritti" todos com uma salsa deliciosa elaborada, especialmente, para a ocasião.

Gian Alessandria, para regar os cogumelos, escolheu uma garrafa de Verduno Pelaverga da vinícola Burlotto de propriedade de seu irmão, Giuseppe.

O almoço corria tranquilo, normal, sem sobressaltos e o papo era agradável.
 

Dia de pouco movimento, coisa rara no "Dai Bercau", permitiu que Gianni esquecesse as panelas e sentasse conosco.

O Verduno Pelaverga havia evaporado.
 

Massimo Bergamin, sócio de Gianni, que não gosta de copos vazios, chegou à mesa com três garrafas de Barolo do Alessandria: Uma de "Monvigliero", outra de "Gramolere" e a última de "San Lorenzo", todas de 2012.
 

As garrafas, abertas para uma degustação, na noite anterior, para um grupo de clientes, da vinícola "Fratelli Alessandria", estavam pela metade.
 

Os extraordinários Barolo elevaram os decibéis das conversas, das risadas e esquentaram corações e bochechas.
 

Não sei como , quando , nem por que, teve início o mais louco desafio vinícola que já participei.

O que restava dos Barolo do Gian, rapidamente evaporou.
 

Massimo foi até a adega do restaurante e voltou com uma garrafa de Barolo "Sotto il Castello di Novello" da Vinícola Giacomo Grimaldi.

Bom vinho, mas não "suportou" o confronto com os do Alessandria.
 

Gianni, já alegre, resolveu revisitar a adega e voltou com uma garrafa de "Composition Reif" da vinícola "Maso Unterganzner Josephus Mayr"

Vinho do Alto Adige produzido com Cabernet Sauvignon, Lagrein e Petit Verdot.
 

Não entendi se o álcool anuviara o cérebro do Gianni ou se ele queria se aproveitar da ocasião para se desfazer daquela garrafa.

  O que sei: foi o pior vinho do almoço.

Escuro, impenetrável, parecendo tinta de caneta Parker 51, quase mastigável...... não entendo como uma porcaria como aquela  possa ter custado quase 50 Euros.
 

Resultado: ninguém conseguiu beber meia taça daquela......

Tentando recuperar a confiança dos convivas, Massimo retornou à adega e voltou triunfante, com uma garrafa de Barolo Riserva 2004 de Enzo Boglietti que infelizmente apresentou problemas: Totalmente morto.

Quando acreditava em uma trégua alcoólica, Gianni correu e voltou com uma garrafa de Barbaresco "Gaiun Martinenga" 2010 da Marchesi di Gresy.

Grande vinho, grande personalidade, grande elegância, mas, sempre há o "mas", eu ainda prefiro o "Martinenga base" da vinícola.
 

A barrique "arredonda", desnecessariamente, o "Gaiun Martinenga".

Gian Alessandria olhou para o relógio (já passava das 16...) e sentenciou "Preciso fazer caminhada. Vou procurar trufas, você vem?".
 
Eu, que precisava caminhar, mais do que o Gian.......fui.

Na próxima matéria, eu conto.

Bacco

quinta-feira, 13 de outubro de 2016

FESTIVAIS? NUNCA MAIS



 Um dos primeiros , se bem recordo, foi "Cantine Aperte" (Adegas Abertas) em Rocchetta Tanaro.

Rocchetta Tanaro, pátria da vinícola Braida, despertou, à época, meu interesse e resolvi conhecer, na fonte, as famosas Barbera de Giacomo Bologna: Bricco dell'Uccellone, Bricco della Bigotta, Ai Suma....

A mulher, que me aliviara uma boa grana (não lembro, quanto) para ter acesso à degustação, me servia gotas de Barbera e narrava a história de cada pingo.
 

Eu, sedento de Barbera e não de propaganda, sai da vinícola, puto da vida, e fui beber em um bar da cidade.

Muitos outros eventos se seguiram: Festival do Barolo, Mangia Longa, Feira do Tartufo D'Alba, Festival do Cogumelo em Albaretto, Festa da Abobra em Piotto e sei lá quantos outros.

 

Cansado de comer em pé e em pratos de plástico, esperar na fila para beber dois dedos de vinho, voltar para a fila tentando conseguir mais dois dedos, chuva, sol, frio..... Chega!

Prometi jamais voltar a frequentar festas, festivais, jornadas temáticas etc.

"Barbera e Champagne"!
 

Champagne, o vinho que mais me seduz, mais uma vez me fez esquecer a promessa e lá fui eu para a festa em Agliano Terme.

Outra ferrada.

Os 40 pequenos produtores de Champagne, anunciados no folheto do evento, estavam tranquilamente jantando em suas casas em Reims, Epernay, Écuiel, Ay etc. e suas garrafas eram apresentadas por seus distribuidores italianos.
 

Eu ainda fui motivo de riso quando me apresentei ao senhor que estava arrumando as garrafas de Champagne e, falando em francês, perguntei, ao "produtor", se seria possível comprar algumas de suas garrafas.

Meu interlocutor me olhou assustado e sem entender uma palavra, gritou, em piemontês, "alguém aí fala francês?"

Desfeito o impasse caímos na risada em.... piemontês.
 

Vender, ele vendia, mas os preços.....

Compro mais barato em Santa Margherita através do meu amigo e representante, Paolo Cogorno.

Os dois dedos de Champagne, que milimetricamente eram despejados, nas taças sedentas, custavam 3,5 Euros.
 

No bar "Defilla" de Chiavari, confortavelmente sentado, uma bela taça de Taittinger, custa 8 Euros.

É sempre bom lembrar que, para acompanhar o Champagne, no "Defilla" são servidos vol-au-vent, lascas de Parmigiano, batatinhas e pedaços de verduras com salsa rosé.

Os 3,5 Euros assustavam a turma do "copo sempre cheio".
 

Tentando fugir de gastos salgados, o pessoal se esquivava do Champagne e se acotovelava nas mesas onde 60 etiquetas de Barbera eram servidas, sem cerimônia e à vontade, para todos aqueles que haviam adquirido a taça por 10 Euros.

Resultado: Perto das 19 horas já havia alguns participantes trocando pernas....
 

O pior ainda estava por vir....

A comida (8 Euros o prato), que deveria começar a ser servida às 19,30, só começou há aparecer 45 minutos depois.

Resultados: italianos, de copos cheios e barrigas vazias,  empurravam, uns aos outros e sem cerimônia,  para conseguir alguma coisa para mitigar a fome.
 

Criei coragem e enfrentei duas filas.

A primeira delas visava conseguir "Vieiras Gratinadas ao Forno".

O molho branco, da receita, escondeu, tão bem, as vieiras que não as encontrei.....

A segunda, mais compacta e agitada, se esforçava para alcançar um pedaço de coelho com creme de pimentão.
 

Quinze minutos de luta, alguns empurrões, muita paciência e finalmente o coelho correu para o meu prato de isopor e talheres de plástico.  
 

Antes que algum esfomeado tentasse roubar meu coelho procurei um canto escuro e equilibrando prato, talheres e taça, acabei devorando o pernalonga.
 

O frio cortante e o saco cheio aceleraram meus passos até o carro e...... festivais, festas, eventos : Adeus!
 
 

Três Champagne salvaram a noite: Petitjean-Pienne Grand Cru, Macquart-Lorette Couvèe Prestige, Guy de Chassey Rosé.

Ótimos vinhos que recomendo com entusiasmo.

Bacco